Brasília, 7 de Setembro:

Um grupo de 20 ou 30 pessoas tenta convencer caminhoneiros a invadir a via que leva ao prédio do Supremo Tribunal Federal.

No carro de som, um homem de 70 anos diz que foi agente da comunidade de informações durante o regime militar e prega a decretação de um AI-5.

Na hora do almoço, churrascarias caríssimas ficam lotadas de manifestantes bolsonaristas, grande parte ligada ao agronegócio.

Ao longo de toda a tarde, grupos xingam policiais: “Traidores!”, berram.

Esses são alguns relatos que o repórter Rubens Valente traz ao TUTAMÉIA do seu trabalho jornalístico durante a manhã e a tarde da manifestação antidemocrática promovida por Bolsonaro na capital da República.

“O que a gente viveu hoje é mais um passo da erosão democrática. Está tendo um afunilamento desse processo. A cara de pau, a covardia de algumas pessoas vai ser colocada à prova agora. Essas pessoas estão sendo levadas a tomar uma atitude final. A sociedade brasileira percebe a gravidade desse momento”, afirma o jornalista.

Repórter experiente, Valente compara a manifestação do 7 de Setembro deste ano em Brasília com outros protestos na cidade. Observa que houve uma escalada no discurso golpista. Dezenas de faixas e cartazes com palavras antidemocráticas e pedindo o fechamento do STF cada vez mais na linha de frente da manifestação.

No entanto, ressalta, “a absoluta maioria não embarcou numa minoria mais radical que queria invadir a via de acesso para chegar ao Supremo. Eram 20 ou 30 pessoas, chamando outros. Várias vezes, tentaram convencer os motoristas a ligar os caminhões e avançar sobre a PM. A absoluta maioria não embarcou nesse discurso. De certa forma, Bolsonaro não conseguiu o que ele queria. Foi um derrotado nesse sentido. Mas ele vai nesse processo de erosão e de cansaço das instituições, de demolição das instituições. Ele pode mudar esse jogo”.

Diferentemente de protestos anteriores, Valente não viu muitos moradores de Brasília, reduto eleitoral de Bolsonaro, eleito no Distrito Federal com 70% dos votos. Lembra que é “a cidade do funcionalismo público”, agora atingido pelo governo Bolsonaro que prepara uma reforma administrativa que será calamitosa para a população.

“Essa massa parece que começou a abandonar Bolsonaro. Vi poucas placas de carros de Brasília, talvez 10%. O que aconteceu foi o interior chegando em caravanas”, conta Valente.

“É o momento de os democratas de várias tendências partidárias, as pessoas de bom senso agirem para evitar uma cena como a dos EUA [no Capitólio]. Não chegamos ainda a ver a invasão de um prédio público, um quebra-quebra com mortes, como lá. Estamos na beira do precipício de isso acontecer.”

Autor de “Os Fuzis e as Flechas: História de Sangue e Resistência Indígena na Ditadura”, Rubens Valente também trata nesta entrevista dos debates sobre o “marco temporal” (acompanhe a íntegra no vídeo e se inscreva no TUTAMÉIA TV).