“Sofremos uma derrota dura. Derrubaram a Dilma, prenderam Lula e ganharam a eleição. Então, moralmente, afeta porque tudo o que a gente tentou não deu certo”, avalia o cientista político Emir Sader em entrevista ao TUTAMÉIA (veja acima a gravação completa). Ao mesmo tempo –e apesar disso–, o lado vitorioso não está conseguindo concretizar seu projeto com a profundidade e rapidez que pretendia.

“Bolsonaro está perdendo aceleradamente o apoio que ele tinha. A esquerda ganhou entre os mais pobres, ganhou entre os negros, perdeu entre as mulheres –talvez muito por causa das mulheres evangélicas. Mas, agora, o setor em que ele mais se desgasta são pobres e mulheres. E lá no Nordeste. Perdeu a lua de mel. Não conseguiu implantar ainda a reforma da previdência e menos ainda a criminalização dos movimentos sociais, não conseguiram…”, lembra Sader.

Por consequência dessas falhas, afirma o filósofo e escritor, “tem a desagregação, a falta da capacidade dele [Bolsonaro] de congregar suas forças. Houve uma quebra relativa com os militares, não sei até onde; teve esse desgaste com os empresários, a grande mídia parece que está desanimada…”

O problema, para o lado da democracia, é que os partidos de esquerda, progressistas, que “saíram feridos” das eleições, ainda não conseguiram elaborar “uma nova estratégia”, que aponte horizontes novos para a população. “Acho que nós não refletimos suficientemente sobre o tamanho da derrota”, diz Saber.

O que não significa que se deve ficar parado. E os partidos não estão parados: “Acho que a esquerda está unida nas questões essenciais: luta contra esse governo, contra o modelo neoliberal”.

Ele alerta que o governo quer mais: “Acho que o projeto do Moro é blindar o Estado, passar de regime de exceção para estado de exceção. Aí não apenas rompe com as normas democrático-liberais, mas tenta fazer uma ditadura efetivamente. Uma parte é isso que ele está fazendo com o Intercept, perseguir indiretamente, de outras maneiras, com Receita Federal. É isso que vai tentar fazer com partidos, com personalidades, com jornalistas, essa perseguição política com denúncia de outra ordem. Podem tentar acabar com o voto obrigatório, para minar o processo eleitoral; alguma forma de parlamentarismo, voto distrital. Enfim, esvaziar a perspectiva de mudança de governo através do processo eleitoral. Esvaziar a democracia.”

A resposta dos progressistas, na opinião dele, que está divulgando a segunda edição de seu livro “Lula e a Esquerda do Século 21”, deve ser unitária: “Nossa luta é para ampliar o espaço democrático da maneira que seja, com quem quer que seja”.