Ele aprendeu a odiar Cuba, Lula e o MST. Há dois anos, depois de alguns tombos, resolveu se reinventar. Resolveu entender o país e seguir o caminho do dinheiro em várias áreas. Descobriu uma máquina de desigualdade no país. Rompeu com o mercado financeiro, onde atuava, e hoje busca aprender com os sem-terra, com quilombolas, com os mais pobres.
Esse é o ex-banqueiro Eduardo Moreira, 43, que, em entrevista ao TUTAMÉIA, conta sobre essa trajetória, analisa a situação política e econômica do Brasil e faz propostas para a oposição (acompanhe no vídeo acima). Engenheiro, empresário, escritor, dramaturgo, ele foi sócio do Banco Pactual. Escreveu sobre doma de cavalos sem violência, fez uma peça infantil e é o autor, entre outros, de “O que os Donos do Poder Não Querem que Você Saiba” (Alaúde, 2017), obra que contribuiu para a ruptura com o mercado financeiro e com os amigos conservadores. “Na máquina de desigualdade da qual eu fazia parte, estava do lado ruim. Eu estava do lado que exercia essa crueldade, essa covardia”, afirma.
“Sou visto como um traidor. Eu me vejo como tendo passado a vida inteira como traidor da espécie. Fiquei do lado do acumular, em vez do partilhar. Fui atacado pelas pessoas do mercado financeiro. Sofri até ameaças de agressão. Em um só dia recebi 1500 ameaças de grupos de extrema direita”, conta. E acrescenta:
“Não existe um adversário maior para a minha caminhada do que as pessoas que estão no governo: Bolsonaro, Paulo Guedes, Salles, Weintraub. Porque a gente quer um mundo completamente diferente, um Brasil menos desigual, mais próspero. Somos adversários, mas a minha solução tem que incluir todo mundo. Eles estão vendo um mundo que não inclui a população brasileira inteira. A solução deles não é inclusiva”.


Na avaliação de Moreira, Bolsonaro está fazendo um governo ruim: “Os bancos têm lucro recorde e a renda real caiu. O resultado vai ser o acúmulo de cada vez mais dinheiro nas pessoas mais ricas. É o aumento da desigualdade, matematicamente falando. Não tem como diminuir a desigualdade no país. Vai tornar a condição do trabalho no Brasil cada vez mais precária e cada vez menos distributiva. Não tem como ter outro tipo de resultado. [O modelo é] cada vez mais extrativista e destruidor do que a gente tem de maior riqueza, que são os recursos naturais”.
Para ele, “os donos do poder estão no governo sem intermediários agora. O que esse governo está fazendo se resume a tornar a mão de obra mais barata. É um capitalismo selvagem e sem limites de acumulação”. E completa:
“Eu torço para que o governo acabe hoje. Mas não se pode fazer isso”. Segundo ele, é preciso ter em primeiro lugar respeito à Constituição. “O governo já cometeu vários atos que não são contemplados na nossa Constituição e que seriam passíveis de impeachment ou de anulação da chapa”, afirma.
Moreira fala de suas experiências em assentamentos e acampamentos do MST:
“O MST foi a descoberta mais bela que eu tive nessa minha caminhada. A capacidade que eles têm de transformação das pessoas e dos lugares que é quase milagrosa. Achei que ia ver problema e encontrei uma solução. O Brasil pode ser um celeiro de vida. O que o MST faz é gerar vida. Virei um superfã do MST”.
E segue:
“A gente costuma colocar o MST como sendo os bandidos da história. Mas eles pegam uma terra degradada, improdutiva, com trabalho escravo, de pessoas que têm uma dívida enorme com a União e não pagam. O MST acelera o processo de reforma agrária que está na Constituição. Não existe solução para o Brasil que não passe pela questão da terra. Menos de 1% dos proprietários de terra têm mais de 50% das terras cultiváveis. Temos que olhar para vida das pessoas”.
Moreira trata de Lula, com quem esteve recentemente para a realização de uma entrevista. “Não conhecia o presidente. Passei a vida inteira aprendendo a odiar o Lula. Era preconceito de classe e medo da capacidade mobilizadora e de liderança que o presidente tem”, afirma. O empresário relata que passou a estudar o desempenho dos governos de Lula e teve o incentivo de sua esposa, Juliana Baroni, atriz que fez a dona Marisa no filme “Lula, o Filho do Brasil” (Fábio Barreto, 2010) e que lhe trouxe outros relatos sobre o ex-presidente.
O ex-banqueiro elogia os governos lulistas, que trouxeram “crescimento e oportunidade para as pessoas mais pobres. Quando se diminui a desigualdade, a democracia floresce. Por isso não querem diminuir a desigualdade. O Brasil é uma falsa democracia. Quem decide são as famílias mais ricas do país. Eu não votei nessas pessoas”.