“No curto prazo, estamos aumentando a nossa vulnerabilidade externa. No médio prazo, se a economia voltar a crescer mais rápido, vamos ter um apagão de derivados. Do ponto de vista da segurança nacional, da segurança energética, essa nossa política é um desastre. No longo prazo, estamos condenando o nosso país à subordinação econômica e à perda de soberania num produto que é absolutamente estratégico para a segurança nacional”.

Essa é a visão do economista Sergio Gabrielli sobre o significado da venda da refinaria Landulfo Alves a um fundo soberano dos Emirados Árabes. Ao TUTAMÉIA, o presidente da Petrobrás nos governos Lula e Dilma avalia o negócio — concretizado no dia 30 de novembro de 2021.

Nesta entrevista, ele trata do desmonte da empresa, do avanço dos acionistas sobre os resultados da companhia, da alta de preços dos combustíveis e da dinâmica do mercado internacional de energia. Fala também das possibilidades de reconstrução da Petrobras, do cenário político e das perspectivas para as eleições do ano que vem (acompanhe a íntegra no vídeo e se inscreva no TUTAMÉIA TV).

Inaugurada em 1950, a Landulpho Alves, na Bahia, foi a primeira refinaria do país e é a segunda em capacidade de produção atualmente.

“Essa privatização diminui a flexibilidade do sistema como um todo, e, portanto, se passa a ter menos eficiência e menos capacidade de atender o mercado interno”, diz Gabrielli.

“Estamos cada vez mais dependentes de importação. O país aumentou enormemente as importações de derivados de petróleo depois de 2016. E isso coloca o mercado brasileiro mais e mais sujeito ao mercado internacional. E coloca cada vez menos autônomo o mercado brasileiro em termos de definição de preços”, assinala.

Gabrielli ressalta que “a estratégia recente da Petrobras tem privilegiado quase que exclusivamente o ganho do acionista de curto prazo”. E que o desmonte em curso está na contracorrente do que acontece no mundo do petróleo.

“Internacionalmente, nós estamos tendo, ao contrário, uma redefinição da geografia do refino mundial, um aumento significativo da capacidade de refino dos países do Oriente Médio. Há um aumento da integração das empresas produtoras de petróleo, com o refino nos países produtores de petróleo, e um aumento estratégico fundamental dos grandes consumidores de petróleo. A Índia e a China, que são grandes consumidores de petróleo, estão montando enormes parques de refino para processar nacionalmente o refino e produzir nacionalmente os derivados necessários. Do ponto de vista internacional, estamos na direção contrária ao que está acontecendo no mundo”, declara.

Para Gabrielli, deveria haver um plano para o aumento da capacidade de refino no país. “Os países que são grandes produtores de petróleo e que têm grandes mercados consumidores domésticos são países que, em geral, mantêm a segurança energética mantendo a capacidade de refino no país”, afirma. E completa:

“Dificilmente países desse tipo são países exportadores de petróleo cru e importadores de derivados –que é para onde nós estamos indo. Do ponto de vista da segurança nacional, da segurança energética a nossa política de médio prazo é um desastre”.

O grupo Mubadala Capital, que comprou a Landulpho Alves, pagou 1,8 bilhão de dólares pela refinaria. Sobre o preço, diz Gabrielli:

“Estudos feitos tanto por bancos como por consultores independentes, como o Ineep (Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustiveis), mostram que a refinaria tem um valor justo que seria mais ou menos o dobro do que foi pago. A refinaria foi vendida muito barata. Se aproveitou da crise mundial. Esse não é um momento para vender; é o momento talvez para comprar. Está se acelerando vendas na bacia das almas”.