“Saio daqui com um compromisso com os nossos queridos irmãos, que nós vamos dar a eles a dignidade que eles merecem, na saúde, na educação, na alimentação e no direito de ir e vir, para fazerem as coisas que eles necessitam na cidade. É simplesmente isso que eu vim fazer aqui, sabe? Nós vamos levar muito a sério essa história de acabar com qualquer garimpo ilegal, e mesmo que seja uma terra que tem autorização da agência para fazer pesquisa, eles podem fazer pesquisa sem destruir a água, sem destruir a floresta e sem que colocar em risco a vida das pessoas que dependem da água para sobreviver.”

Palavras do presidente Lula, que no último sábado foi ver a situação de miséria, desespero e risco imediato de morte por fome que vivem crianças, mulheres e homens do povo yanomami em Rondônia. Eles foram abandonados ao longo do governo Bolsonaro, que não só foi omisso no atendimento como atuou para deliberadamente prejudicar os indígenas, como apontam denúncias no país e em tribunais internacionais.

Sobre isso, Lula afirmou: “Sinceramente, o presidente que deixou a presidência esses dias, se, ao invés de fazer tanta “motociata”, tivesse vergonha e viesse aqui uma vez, quem sabe esse povo não estivesse tão abandonado como tá”.

Leia a seguir a íntegra da fala de Lula e suas respostas a algumas perguntas feitas por jornalistas na ocasião.

“ESSE PAÍS MUDOU DE GOVERNO E O GOVERNO AGORA VAI AGIR COM SERIEDADE

NO TRATAMENTO DO POVO QUE ESSE PAÍS TINHA ESQUECIDO”

Transcrição do pronunciamento do Presidente da República,

Luiz Inácio Lula da Silva, em Boa Vista (RR), realizada no dia 21 de janeiro de 2023

“Olha, apenas uma informação pra vocês: se alguém se alguém me contasse que aqui em Roraima tinha pessoas sendo tratadas da forma desumana, como eu vi o povo yanomami sendo tratado aqui, eu não acreditaria. Eu por acaso tive acesso a umas fotos essa semana, as fotos efetivamente me abalaram, porque a gente não pode entender como é que um país que tem as condições que tem o Brasil, deixar os nossos indígenas abandonados como eles estão aqui. Ou seja, são pessoas que são trazidas para cá para receber salário e depois não sabem quando voltam, eles são agentes de saúde, são pessoas que estão há seis meses aqui, tem filha, tem crianças lá na aldeia e não tem como voltar. Ou seja, ninguém tem certeza de nada aqui. Ou seja, então eu vim para cá para dizer que nós vamos tratar os nossos indígenas como seres humanos, sabe? Responsáveis por parte daquilo que nós somos, e nós vamos cuidar para aqueles que eles sejam tratados como seres humanos de primeira classe, não ser tratado como gente de quarta classe ou de quinta classe. É desumano o que eu vi aqui.

Sinceramente, o presidente que deixou a presidência esses dias, se ao invés de fazer tanta “motociata”, tivesse vergonha e viesse aqui uma vez, quem sabe esse povo não estivesse tão abandonado como tá. Eu vim aqui assumir o compromisso com os caciques, com os companheiros aqui, eu vim aqui com o Ministro do Desenvolvimento Regional combater a fome, eu vim com a Ministra da Saúde, que é a ministra Sonia, com a Ministra dos Povos Indígenas, vim com o Ministro da Justiça, vim com a presidenta da Funai, dos Direitos Humanos, vim com meu companheiro Ministro Secretário-Geral, vim com a minha mulher Janja, porque eu tô viajando amanhã para a Argentina e eu não queria sair do Brasil se fazer uma visita, sabe? Num território brasileiro. E quis Deus que eu viesse aqui, e eu saí daqui com um compromisso com os nossos queridos irmãos, que nós vamos dar a eles a dignidade que eles merecem, na saúde, na educação, na alimentação e no direito de ir e vir, para fazerem as coisas que eles necessitam na cidade. É simplesmente isso que eu vim fazer aqui, sabe? Nós vamos levar muito a sério essa história de acabar com qualquer garimpo ilegal, e mesmo que seja uma terra que tem autorização da agência para fazer pesquisa, eles podem fazer pesquisa sem destruir a água, sem destruir a floresta e sem que colocar em risco a vida das pessoas que dependem da água para sobreviver.

Então, é importante as pessoas saberem que esse país mudou de governo e o governo agora vai agir com seriedade no tratamento do povo que esse país tinha esquecido. Muito obrigado a vocês da imprensa, muito obrigado, e obrigado aos companheiros, obrigado ao governador, obrigado ao prefeito, obrigado aos deputados, obrigado a todos. Eu prometo para vocês que em março eu virei na assembleia que vai ser na Raposa Serra do Sol e prometo a vocês que nós vamos resolver esse problema daqui. Essas pessoas vão ser tratadas decentemente. Tá bem, gente? Um abraço e um beijo no coração!

Fotos Ricardo Stuckert e Divulgação

ENTREVISTA DE LULA

QUAIS MEDIDAS VÃO SER TOMADAS IMEDIATAMENTE, PRESIDENTE, PARA SOCORRER OS POVOS?

Veja, a primeira coisa que nós temos que fazer é garantir transporte para as pessoas que estão há seis meses esperando aqui para ir embora. Pessoas que deixaram crianças na aldeia e que estão aqui. Pessoas que vieram pra receber o salário e não sabem quando voltam. O trabalho de transporte, sabe, é precário, é muito precário. É preciso que a gente dê um jeito de aumentar a pista para pousar um avião um pouco maior, em Surucucu, para que a gente possa transportar mais gente, que a gente possa levar mais alimento. Então, é preciso que a gente faça o que tem que ser feito, sabe? Não pode ser feito de um dia para outro, não pode ser feito em poucas horas, mas o meu compromisso é de fazer.

JÁ VEM AS EQUIPES DE SAÚDE A PARTIR DE SEGUNDA-FEIRA?

As equipes de saúde vão vir pra cá, eu tava dizendo para a ministra que a saúde deve ir lá na aldeia e não esperar que eles venham aqui na cidade. A gente é que tem que ir lá para tratar deles, para cuidar deles, sabe? É isso que nós vamos fazer, nós vamos civilizar o tratamento que se dá aos povos indígenas aqui.

PRESIDENTE, O SENHOR QUE COMBATE TANTO A FOME, COMO FOI PARA O SENHOR VER ESSAS PESSOAS?

Eu, sinceramente, não acreditava. Eu não queria crer que eu ia ver, sabe, as pessoas com a fome que essas pessoas têm. Quase todos… eu não posso julgar a qualidade da comida, porque eu não comi, mas quase todos se queixam da comida. Eu não sei se é por causa do hábito alimentar, não sei o que que é, mas quase todos se queixaram da comida, quase todos reclamaram do frango, quase todos reclamaram do peixe, sabe? Eu não sei se é por conta do hábito alimentar ou porque não tava bom mesmo. Todos se queixam que estão aqui e não sabem quando voltam, não sabem quando vai ter um avião para levar ele de volta. Então, e eu vi as criancinhas bem magrinhas, bem desnutridas, significa que essas crianças precisam tomar vitamina, sabe? E eu acho que uma das formas da gente resolver isso, é fazer com que a gente monte o plantão da saúde, sabe, nas aldeias, para que a gente possa cuidar deles lá. Fica mais fácil a gente transportar dez médicos do que transportar duzentos indígenas que estão aqui. É apenas uma questão de mudança de comportamento. A nossa ministra Lívia sabe que tem que fazer. Nós queremos mostrar que o SUS é capaz de fazer um trabalho, sabe, que que honra e orgulha o povo brasileiro, como fez na covid-19. E eu prometo a vocês que nós vamos melhorar a vida dele, é isso.

PRESIDENTE, QUAIS MEDIDAS VÃO SER FEITAS PARA EXPULSAR O GARIMPO ILEGAL?

Eu não posso dizer quais medidas que serão feitas, o que eu posso dizer para você é que não vai existir mais garimpo ilegal. E eu sei da dificuldade de tirar o garimpo ilegal, eu sei que já se tentou outras vezes tirar e eles voltam, sabe? Mas nós vamos tirar! Lamentavelmente, eu não posso dizer pra você até quando, o que posso dizer é que nós vamos tirar.

 

SAIBA QUAIS SÃO AS PRIMEIRAS AÇÕES

(texto divulgado pela assessoria da Presidência da República)

Na sexta-feira (20), o presidente Lula editou um decreto que cria o Comitê de Coordenação Nacional para Enfrentamento à Desassistência Sanitária das populações em território Yanomami. Além disso, a ministra Nísia Trindade, declarou Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional diante da necessidade de ação urgente frente à crise enfrentada por esses povos indígenas. Os atos foram publicados no Diário Oficial da União.

“No caso da saúde, nós definimos que essa situação é uma emergência sanitária de importância nacional semelhante a uma epidemia. É isso que precisa ficar claro. A Saúde está determinada a resolver as emergências. Mas a sociedade tem que estar consciente do que está acontecendo aqui”, frisou a ministra da Saúde. Além da declaração de emergência, o Ministério da Saúde instalou o Centro de Operações de Emergências em Saúde Pública (COE – Yanomami) como mecanismo nacional da gestão coordenada da resposta neste campo. A gestão do COE estará sob responsabilidade da Secretaria de Saúde Indígena (Sesai/MS), considerando a tipologia da emergência.

Na próxima segunda-feira (23), um conjunto de ações serão iniciadas, voltadas para a assistência de saúde, em especial. Uma equipe da Força Nacional do Sistema Único de Saúde (SUS) chegará a Boa Vista, com 13 profissionais, que irão operar o Hospital de Campanha. Outra equipe multidisciplinar com oito profissionais da área de saúde da Aeronáutica será deslocada de Manaus para a região de Surucucu (a cerca de 270 km a oeste da capital roraimense). O Hospital de Campanha da Aeronáutica, hoje no Rio de Janeiro, começará a ser transferido para Boa Vista. A expectativa é que ele seja montado no dia 27 de janeiro. Outra medida é o início do transporte de retorno para as aldeias dos Yanomami sem problemas de saúde e que se encontram no CASAI de Boa Vista.

CESTAS BÁSICAS — As ações reunirão equipes da Força Nacional de Segurança (que já estão na região), além de profissionais da Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e Polícia Militar, que atuarão em conjunto para montar uma estratégia que garanta a segurança dos profissionais de saúde que atuarão nesta missão. A Aeronáutica iniciará, em caráter de urgência, o transporte de cesta básicas para a terra indígena Yanomami.

Serão entregues, imediatamente, as cestas básicas que já estão na Fundação Nacional do Índio (Funai), em Boa Vista. Outras mil estão sendo entregues, para a distribuição nos territórios. O ministro Wellington Dias registrou que as cinco mil cestas correspondem a 85 toneladas de alimentos. Elas vieram do Amapá, em aviões da FAB, e fazem parte de uma parceria entre a pasta de Dias, o Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos, a Funasa e as Forças Armadas. O trabalho de estocagem e distribuição das cestas já teve início.

“É uma vergonha presenciarmos indígenas morrendo de fome no país que é o quarto maior produtor de alimentos do mundo! As equipes indígenas e as autoridades de Roraima disseram que ainda não se sabe, ao certo, quantas pessoas morreram neste genocídio, agravado por ser dentro de um território Yanomami, de proteção e responsabilidade federal, que permitiu garimpo ilegal, mercúrio contaminando as águas e presença do crime organizado”, afirmou Wellington Dias.

Serão enviados também 200 latas de suplementos alimentar para crianças de várias idades, que serão transferidas do Distrito Sanitário Especial Indígena Leste (DSEI Leste) para o DSEI Yanomami. A operação exigirá um esforço de logística. Uma vez que o aeroporto de Surucucu está em obras, o transporte de alimentos será feito em aeronaves de pequeno porte, exigindo cerca de 50 voos nesta etapa. As aeronaves levarão comida até a região e haverá distribuição com o apoio de helicópteros. Na volta, os aviões levarão para Boa Vista os Yanomami que necessitam de atendimento médico. O Pelotão Especial de Fronteira (PEF), sediado em Surucucu, alojará as equipes de saúde e todos profissionais enviados para a região.

Ainda neste sábado, ocorrerá a transferência de equipamentos, material médico e profissionais — uma ambulância, duas barracas de campanha, uma com ar condicionado, e médicos especialistas, atualmente disponíveis na Operação Acolhida, voltada aos refugiados venezuelanos, para o CASAI-Boa Vista.

DRAMA — Atualmente, mais de 30,4 mil habitantes vivem no território indígena Yanomami e a situação na maior reserva indígena do país é dramática. Desde a última segunda-feira (16), equipes do Ministério da Saúde que estão na região se depararam com crianças e idosos em estado grave de saúde, com desnutrição acentuada, além de muitos casos de malária, infecção respiratória aguda (IRA) e outros agravos.

O ministro da Flávio Dino determinará abertura de inquérito policial para apurar o crime de genocídio e crimes ambientais no território indígena Yanomami. A partir de segunda-feira (23), a Polícia Federal ficará responsável por apurar as responsabilidades e punir os culpados. “Há fortes indícios de crime de genocídio, que será apurado pela PF”, destacou o ministro da Justiça e Segurança Pública. Dados de 2022, divulgados pelo Ministério dos Povos Indígenas, revelam que 99 crianças Yanomami morreram em função do avanço do garimpo ilegal na região — e as vítimas foram crianças entre um a 4 anos, acometidas de desnutrição, pneumonia e diarreia.

Na quarta-feira (25) está previsto o retorno da equipe de profissionais Ministério da Saúde e, a partir daí, espera-se que o grupo conclua em 15 dias um levantamento completo sobre a crítica situação de saúde dos indígenas Yanomami.