“O que mais importa é aumentar a indignação diante do que vem ocorrendo no Brasil. De que maneira os pobres estão sendo tratados! Aqui em São Paulo, esse escândalo da repressão da cracolândia. Me lembrou um pouco Israel reprimindo os palestinos no enterro de uma jornalista americana. Foi uma coisa terrível. Aqueles homens de metralhadora enfrentando os usuários de crack como se fossem criminosos. E o governador, que está em campanha, achando isso normal. Até quando nós vamos tolerar que os yanomamis sejam dizimados pela presença de milhares de garimpeiros? Quando nós vamos terminar o racismo? Quando nós vamos terminar o extermínio dos adolescentes e jovens negros nas periferias das grandes cidades, onde a polícia militar funciona como uma força de ocupação?”
Palavras de Paulo Sérgio Pinheiro ao TUTAMÉIA ao tratar da 50ª sessão do Tribunal Permanente dos Povos que acontece nos dias 24 e 25 de maio. Em São Paulo, o evento –que também inclui a participação virtual de personalidades mundiais em defesa dos direitos humanos– acontece na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco. Com outras entidades, TUTAMÉIA retransmite os debates.
Ministro de direitos humanos no governo Fernando Henrique Cardoso, coordenador da Comissão da Verdade e um dos fundadores da Comissão Arns, Pinheiro afirma:
“É preciso a tomada de consciência. Não só a tomada de consciência. Essa indignação. Por exemplo, pela maneira que foram tratados os profissionais de saúde, que foram jogados em frente aos leitos dos pacientes com Covid sem nenhum protocolo, sem nenhum tratamento. Indignação com a privatização do SUS, colocada desde o começo do governo Bolsonaro. Essa ameaça continua. Esse mau trato dos funcionários da saúde pública. Essa é uma tomada de consciência. A outra tomada de consciência –e, por isso, o Tribunal tem no título ‘Pandemia e Autoritarismo’– é porque jamais houve, desde 1988, um governante eleito para destruir as conquistas de direitos garantidos pela Constituição. Nenhum outro presidente tratou a sociedade civil como inimiga, como esse governo trata”.
Nesta entrevista, o cientista político trata da contínua ameaça de golpe de Bolsonaro, das Forças Armadas, da necessidade de resistência e da permanência da extrema direita no cenário brasileiro (acompanhe a íntegra no vídeo e se inscreva no TUTAMÉIA TV).
“Estamos num momento de emergência. Temos um presidente da República que todo dia anuncia que vai fazer alguma irregularidade. Pode não ser um golpe de Estado como em 1964, mas pode ser um tumulto. Ele já anunciou. Ele pode melar a campanha eleitoral. É um momento de tomada de consciência da emergência. É preciso que os candidatos, as universidades, os sindicatos, os intelectuais, os jornalistas se ponham como resistindo a essa tentativa de golpe que o presidente todo o dia avisa”, declara.
Na visão de Pinheiro, “a extrema direita no Brasil, esses 30%, vieram para ficar”. A razão está na incompletude da democracia.
“A democracia é incompleta. Apesar de todos os progressos –e não quero menosprezar os enormes progressos que foram feitos–, em três pontos a democracia é incompleta”.
“Primeiro, na concentração de renda. Somos o segundo lugar no campeonato mundial; o Catar é o primeiro. Houve melhorias em alguns momentos”.
“Segundo, na questão da violência, que não foi enfrentada a contento pelos governos democráticos. Há tortura nas prisões, nas delegacias, há o mal funcionamento dos sistemas policiais. A manutenção das polícias militar e civil foi um desastre que continua”.
“Terceiro, o racismo. Somos um país onde sobrevive um apartheid em relação a todos os não brancos. Somos um etnocracia, onde todas as instituições funcionam a favor dos brancos”.
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