“Para mim, o ministro Fachin fez o que era de se esperar num momento desses: resolveu entregar os anéis para não ter de entregar os dedos. O fato é que estava pautado para esta semana, ao que tudo indica, o julgamento do habeas corpus da suspeição de Moro, e isso poderia ter consequências muito drásticas para Sérgio Moro. Se reconhecida sua suspeição e o fato de que Moro, conscientemente, perseguiu Lula, e não se deu por suspeito tendo sentimento de hostilidade em relação a ele, isso poderia levar à conversão de sua exoneração em demissão pelo Conselho Nacional de Justiça. E isso seria o que o país esperaria em termos de ética pública nesse momento.”

Assim Eugênio Aragão, ministro da Justiça no governo Dilma, comentou ao TUTAMÉIA a anulação dos processos com o ex-presidente Lula determinada nesta segunda-feira, 8 de março, em decisão monocrática do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal. Em resumo, diz Aragão, “Sofremos aí um atalho. O ministro Fachin resolveu reconhecer o óbvio, que já era dito desde o começo, que Moro era incompetente para esses processos”.

Na entrevista –clique no vídeo para ver a íntegra e se inscreva no TUTAMÉIA TV–, Aragão, que foi advogado da campanha presidencial de Lula em 2018, lembra as arbitrariedades e ilegalidades cometidas contra o ex-presidente:

“O presidente Lula ficou 580 dias preso. Foi impedido de se candidatar. Foi impedido de ir ao velório de seu irmão. Foi impedido de ir ao velório de Sigmaringa Seixas. Foi impedido de ir ao velório do neto –só pode ir ao enterro. São tantos impactos dramáticos na vida dele por causa dessa prisão decretada por um juiz que, todo mundo já sabia que era incompetente, para não dizer que ele era suspeito”.

Sobre sua reação à sentença, Aragão afirma: “Estou extremamente satisfeito com essa decisão, que implica imediatamente a recuperação dos direitos políticos por parte de nosso querido ex-presidente. Ele agora está livre para ser candidato, vai voltar a ter sua plenitude política”

Mas há um outro lado: “Ao mesmo tempo, devo me confessar profundamente indignado, revoltado com cinismo disso tudo. No fundo, essa decisão foi tomada na undécima hora para proteger Moro. Não tem nada de jurídico nisso, tem muito de político nisso. Mais numa vez. O que eu acho mais grave, agora, é essa confissão do tamanho da violência do tamanho da violência que praticaram contra o ex-presidente Lula. E vou até mais longe. Agora fica muito claro que quem fraudou as eleições foi o Ministério Público e a Justiça Eleitoral, que não deixaram Lula ser candidato, quando todo mundo sabia que Moro não era competente, quando todo mundo sabia o grau de comprometimento emocional, político, politiqueiro de Moro com esse caso do presidente Lula”.

No mesmo sentido, comemorando e mantendo o espírito crítico e alerta, vai a nota divulgada pela defesa do ex-presidente Lula, que vai a seguir, na íntegra:

NOTA DA DEFESA DE LULA SOBRE A DECISÃO DO MINISTRO EDSON FACHIN

Recebemos com serenidade a decisão proferida na data de hoje pelo Ministro Edson Fachin que acolheu o habeas corpus que impetramos em 03.11.2020 para reconhecer a incompetência da 13ª. Vara Federal Criminal de Curitiba para analisar as quatro denúncias que foram apresentadas pela extinta “força tarefa” contra o ex-presidente Lula (HC 193.726) — e, consequentemente, para anular os atos decisórios relativos aos processos que foram indevidamente instaurados a partir dessas denúncias.

A incompetência da Justiça Federal de Curitiba para julgar as indevidas acusações formuladas contra o ex-presidente Lula foi por nós sustentada desde a primeira manifestação escrita que apresentamos nos processos, ainda em 2016. Isso porque as absurdas acusações formuladas contra o ex-presidente pela “força tarefa” de Curitiba jamais indicaram qualquer relação concreta com ilícitos ocorridos na Petrobras e que justificaram a fixação da competência da 13ª. Vara Federal de Curitiba pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento da Questão de Ordem no Inquérito 4.130.

Durante mais de cinco anos percorremos todas as instâncias do Poder Judiciário para que fosse reconhecida a incompetência da 13ª. Vara Federal Criminal de Curitiba para decidir sobre investigações ou sobre denúncias ofertadas pela “força tarefa” de Curitiba. Também levamos em 2016 ao Comitê de Direitos Humanos da ONU a violação irreparável às garantias fundamentais do ex-presidente Lula, inclusive em virtude da inobservância do direito ao juiz natural — ou seja, o direito de todo cidadão de ser julgado por um juiz cuja competência seja definida previamente por lei e não pela escolha do próprio julgador.

Nessa longa trajetória, a despeito de todas as provas de inocência que apresentamos, o ex-presidente Lula foi preso injustamente, teve os seus direitos políticos indevidamente retirados e seus bens bloqueados. Sempre provamos que todas essas condutas faziam parte de um conluio entre o então juiz Sergio Moro e dos membros da “força tarefa” de Curitiba, como foi reafirmado pelo material que tivemos acesso também com autorização do Supremo Tribunal Federal e que foi por nós levado aos autos da Reclamação nº 43.007/PR.

Por isso, a decisão que hoje afirma a incompetência da Justiça Federal de Curitiba é o reconhecimento de que sempre estivemos corretos nessa longa batalha jurídica, na qual nunca tivemos que mudar nossos fundamentos para demonstrar a nulidade dos processos e a inocência do ex-presidente Lula e o law fare que estava sendo praticado contra ele.

A decisão, portanto, está em sintonia com tudo o que sustentamos há mais de 5 anos na condução dos processos. Mas ela não tem o condão de reparar os danos irremediáveis causados pelo ex-juiz Sergio Moro e pelos procuradores da “lava jato” ao ex-presidente Lula, ao Sistema de Justiça e ao Estado Democrático de Direito.

Cristiano Zanin Martins e Valeska Teixeira Zanin Martins, advogados do ex-presidente Lula