O discurso é simplificado. Não se fala em estruturas complexas de sociedade, de política, de economia. A saída é apontar um inimigo: somos nós contra eles. Eles são a explicação de todo o mal. E o populista se apresenta como o salvador.
É nessas linhas gerais que a extrema direita trafega para se expandir pelo mundo –e no Brasil. Para debater esse contexto, TUTAMÉIA entrevistou a filósofa Catarina Dutilh Novaes, professora da Universidade Livre de Amsterdã (clique no link do alto para ver a entrevista completa).
“É um discurso muito sedutor, porque simplifica tudo. É muito mais fácil do que entender relações sociais e econômicas complexas. É maniqueísta. Tudo que está dando errado na sua vida, você tem alguém para culpar. É a ideia do ressentimento. De certa forma, o bolsonarismo é o movimento dos ressentidos, da baixa classe média, que está se sentindo pequena, não tendo o devido respeito na sociedade. Bolsonaro é um militar de baixo clero e as pessoas se identificam com ele”, afirma Catarina.
A filósofa também comentou os ataques que Bolsonaro e integrantes de seu governo fazem à ciência e à filosofia –à educação em geral. Para ela, essa agressividade revela um temor à filosofia, porque ela incentiva a autonomia intelectual. “O que eu acho que acontece, que é uma coisa comum a regimes totalitários, personagens políticos totalitárias de modo geral, é um ataque a áreas do conhecimento que são, por definição, contestadoras. Filosofia é questionar o óbvio. Ou seja, a filosofia é inerentemente subversiva.”
Interessada na análise de discursos, ela fala da dificuldade de diálogo com pessoas que pensam muito diferente –um fenômeno que tende a profundar a polarização nas sociedades. Para a filósofa, é fundamental buscar a conversa, mesmo que seja muito difícil. Nesta entrevista ao TUTAMÉIA, ela relata experiências positivas nesse sentido. Fala de terraplanistas, dos que negam a eficiência das vacinas, do movimento contra a ciência e o iluminismo. Discorre sobre a questão do “lugar de fala”, defende a educação pública e critica a privatização do ensino.
A ideologia que acomete o eleitor do Bolsonaro furta-lhe até mesmo a possibilidade de saber-se enfermo; não saber é parte da própria doença.