“O assassinato de um homem negro pela polícia, como o que ocorreu em Minneapolis, pode lançar luz para o que está ocorrendo também em outros lugares, como na França, na Inglaterra, aqui no Brasil. Nas favelas, a polícia está matando gente. Temos de pensar nisso também: a palavra é solidariedade.”

É a reflexão do historiador norte-americano Ibrahim Sundiata, especialista na história da escravidão. Aos 75 anos, ele está em uma espécie de autoexílio no Brasil: seus planos de voltar ao seu país foram frustrados por causa da pandemia e de um tratamento médico.

Desde Salvador, onde está morando no momento, ele falou ao TUTAMÉIA sobre a importância e os possíveis desdobramentos das manifestações contra o racismo e contra a violência policial, que estão acontecendo nos Estados Unidos depois do assassinato de George Floyd por um policial branco (assista à entrevista no vídeo acima e se inscreva no TUTAMÉIA TV).

“Desta vez, temos de exigir, claramente, o fim da impunidade da violência policial. No caso George Floyd, o policial que o matou voltou para casa, passou alguns dias em casa, antes de ser preso. Ele deve ficar na prisão, assim como os outros policiais que o acompanhavam. Se não, vamos continuar nesse ritmo: assassinato, protestos, manifestações, promessas, nada.”

Sundiata lembrou de crimes anteriores, hoje quase esquecidos: “Participei dos protestos depois da morte de Rodney King, em Los Angeles. Toda a cidade protestou, e toda a população jovem foi às ruas. Eu morava em Boston e saí com meus alunos para uma manifestação, para dizer “Nunca mais!”. Os políticos sempre vêm com promessas, mas nada aconteceu. Mas, depois de Rodney King, houve muitas outras mortes. Durante o mandato de Obama, um rapaz, Trevon Martin, foi assassinado dentro do condomínio onde morava seu pai, foi morto por ser negro. Houve novamente protestos em todo o país, eu participei em Boston. É preciso parar com isso!”

Descendente de escravos, ele fala sobre o racismo nos Estados Unidos, a violência contra a população negra e a resistência. Vê no movimento Black Lives Matter (Vidas Negras Importam) um continuador das lutas pelos direitos civis, herdeiros de figuras como Martin Luther King, Malcolm X e os Panteras Negras.

Apesar da força do movimento, porém, identifica na sociedade norte-americana e mesmo na população negra um esquecimento das vítimas do racismo e da violência policial.

“Será que em agosto ainda vamos falar de George Floyd? Espero que sim, mas, pergunto, estamos falando de Trevon Martin, estamos falando de Sandra Bland [duas outras pessoas negras vítimas da violência policial]? Não estamos falando, desculpe, não estamos. Há uma lista de mortos esquecidos.”

Por isso, ele diz, quase num chamamento: “Temos de manter a memória. Temos de manter a pressão”.