“O Rio Grande do Sul vive uma tragédia histórica na vida política, econômica e social do estado. Mas é uma tragédia anunciada. O governador [Eduardo Leite} não é o culpado pelo que está acontecendo. Ele é um instrumento dos culpados, porque ele adotou uma visão tecnicista, neoliberal”.

A visão é de Tarso Genro em entrevista ao TUTAMÉIA. Ex-governador do RS, ex-prefeito de Porto Alegre e ministro nos governos Lula, ele avalia que, apesar do desajuste climático global, o sofrimento poderia ter sido reduzido em 60%, 50%. “Não teria condição de dizer que não haveria nada. Haveria, mas seria muito menor, sob controle. O governo não tinha nenhum roteiro de alerta, por exemplo”.

Genro lembra que o atual prefeito de Porto Alegre, um bolsonarista fanático, e seu antecessor, também bolsonarista, deixaram de tomar medidas elementares de manutenção das proteções da cidade contra enchentes e esvaziaram a força do quadro técnico municipal, o que amplificou os efeitos da cheia inédita.

Ao TUTAMÉIA, Genro comenta a contratação, pelo prefeito Sebastião Melo, da empresa norte-americana Alvarez & Marsal. “O bolsonarismo, como projeto estratégico, compõe um projeto global da extrema direita que tem origem nos países de capitalismo mais desenvolvido e que tem uma rede de articulações que se articulam em nós muito consistentes e muito previsíveis. Essa empresa é ligada a um conjunto de empresas mundiais que está escorada numa visão da extrema direita americana, do Partido Republicano. Não foi surpresa essa movimentação, porque o Melo é um nó dessa cadeia”. E segue:

“Não é de graça que, quando a extrema direita assume a prefeitura, com o prefeito antes do Melo, ele trouxe um conjunto de jovens pequeno-burgueses, de jovens acadêmicos ligados ao sistema de negócios do capital financeiro. Fez um ‘banco de talentos’. Eram pessoas de extrema direita comprometidas com essa visão neofascista que está se espalhando no mundo. Isso não deu certo”.

Avaliando a ascensão da direita no estado e na extrema direita na prefeitura, Genro observa: “O que foi derrotado em Porto Alegre não foi a esquerda, foi a visão iluminista que vem da revolução francesa” (Clique no vídeo acima para ver a entrevista completa e se inscreva no TUTAMÉIA TV)

Sobre o futuro processo de reconstrução e a posição da elite empresarial gaúcha, muito ligada ao bolsonarismo, ele afirma: “80% da elite gaúcha sempre foi de direta, parte dela sempre foi bolsonarista antes de o bolsonarismo existir, e, parte, é fascista. 20% são empresários, entre aspas, normais. Esses 80% são incuráveis. Se tivesse um golpe, estariam com os militares”.

A catástrofe, porém, traz outros elementos para análise. “Vai ter um impacto no empresariado gaúcho, até porque muitas das obras que o governo federal vai fazer no Rio Grande do Sul podem ser feitas por empresários gaúchos. Quadros técnicos nós temos na universidade e em várias empresas gaúchas, ou empresas de engenharia gaúchas. Não podemos esquecer que essas empresas de engenharia participaram da tentativa de golpe”.

Advogando a necessidade de uma união dos democratas para a reconstrução o estado e do ambiente de debate político, Genro constata:

“Tem uma diversidade de relações de solidariedade que nunca existiram na cidade. Tem uma movimentação majoritária e unitária das verdadeiras pessoas do bem. Nós podemos sair mais fortes; depende da capacidade de intervenção concreta em cada um dos fatos”.