“O que pesava na contestação militar era a forte influência nacionalista e comunista entre os oficiais, muitos simpatizando com o Partido Comunista. Tanto assim que a luta pela Petrobras foi fundamentalmente feita por oficiais nacionalistas e comunistas. Os dois nomes mais célebres, Horta Barbosa e Estilac Leal, eram homes de esquerda, simpatizando com o comunismo e com os nacionalistas. Havia uma convergência entre trabalhistas e comunistas. Os trabalhistas eram nacionalistas de fundo, e comunistas que se aproximaram dos nacionalistas. O anti-imperialismo era o denominador comum de nacionalistas e de comunistas. A ideia era de que a ditadura era entreguista, e era uma ideia que se justificava, sobretudo naquele momento que tinha Roberto Campos no governo. Havia um elemento nacionalista mesmo na direita militar”.

É o que analisa o historiador João Quartim de Moraes ao falar ao TUTAMÉIA sobre o contexto histórico da luta armada contra a ditadura e da adesão de militares ao movimento, como foi o caso de Carlos Lamarca, assassinado há 50 anos na Bahia. Autor de “A Esquerda Militar no Brasil”, Quartim trata daquele momento político e avalia as contradições atuais entre os militares (acompanhe a íntegra no vídeo e se inscreva no TUTAMÉIA TV).

“Entre o governo Geisel e os dias de hoje já foram mais de 40 anos, uma geração e meia de militares. Essa cúpula que chegou ao poder hoje é lamentável do ponto de vista do patriotismo. É lamentável a subserviência aos EUA. Tenho a forte impressão que muitos militares, muitos oficiais da ativa não têm simpatia nenhuma por essa subserviência aos Estados Unidos”, afirma.

Professor na Unicamp e exilado político, Quartim integrou a Vanguarda Popular Revolucionária. Foi a VPR a organização a qual Lamarca aderiu ao deixar o quartel em janeiro de 1969.

“A ditadura vinha anulando eleições. Eles não iam aceitar sair em um prazo previsível. Era preciso fazer algo. Não se aceitava o golpe, a preservação daquele regime odioso. Havia uma paixão, um forte impulso. Era o espírito da época na juventude, a contestação”, declara.

MÚSICA CELEBRA MEMÓRIA DE ZEQUINHA E LAMARCA

Na série de entrevistas para debater a trajetória e o legado de Carlos Lamarca, cinquenta anos depois de seu assassinato, TUTAMÉIA mostrou também músicas que lembram a resistência armada contra a ditadura militar.

Apresentamos, por exemplo, a música-tema filme “Do Buriti à Pintada – Lamarca e Zequinha na Bahia”, documentário dirigido por Reizinho Pereira dos Santos.

Sobre a canção “A Verdade Pintada ao Chão”, Reizinho conta: “Estávamos na edição final do filme e ainda não tinha uma música inédita. Eu e meu parceiro Jarbas Essi fizemos em uma sentada só e convidamos nosso amigo e parceiro Gerri Cunha para gravar”.

Pois agora o próprio cantor e compositor Gerri Cunha, hoje coordenador de cultura em Ibotirama – Bahia, grava um vídeo especialmente para o público de TUTAMÉIA.

A VERDADE PINTADA AO CHÃO

Do punhal que fere o Brasil nem um tempo a ferida estancou.

Estudantes gritaram

Quem viu a opressão num retrato sem cor.

Houve um brado na fábrica fabricando sonhos para nós. Pelas ruas vestido de alma Zequinha enfrentou nosso algoz.

Zequinha é a revolução de um povo gemendo de dor

e a verdade escondida ao porão, a história foi quem revelou.

Lamarca marcou os seus passos

marcados trilharam caminhos

caçados que nem passarinhos

Lutaram, mas nunca sozinhos.

Partiram pra luta amada levando a verdade de cor, voltaram para Terra armada de gente, de sonho e suor.

Na Pintada pintaram seu quadro

rabiscos de sangue no chão Liberdade nunca foi um fardo

desenhado no chão do Sertão.

Zequinha não é um momento,

não vive o tempo em fração,

Lamarca é encantamento,

virou ave de arribação.

Estrelas pelo firmamento virando lua no céu

tornando chuviscos ao vento

folhagem virando papel.

Tombando com tiros no peito

Zequinha não perdeu a voz.

E agora, Zequinha virou nós. E agora, Lamarca virou nós.