As manobras realizadas por Bolsonaro e seus apoiadores para tentar impedir a realização da CPI da Pandemia são “uma confissão de culpa”, conforme avaliação do senador Humberto Costa. Em entrevista ao TUTAMÉIA, o líder do PT no senado afirma: “O governo sabe que cometeu uma série de crimes contra a saúde pública. Sabe que a CPI vai mostrar todos os absurdos que foram cometidos pelo governo ao longo desse período, e isso vai promovendo um processo de desgaste nos apoios que o governo tem. Ele teme que o processo de erosão política, de erosão do apoio político vai se aprofundar com a CPI. Por isso essa resistência toda ao funcionamento da CPI”.

Na conversa, realizada ao final da primeira semana de trabalhos da comissão, o parlamentar, que foi ministro da Saúde no governo Lula e preside a Comissão de Direitos Humanos do Senado, lembra as tentativas bolsonaristas de impedir a implementação da CPI:

“A CPI representou uma derrota para o governo. No primeiro momento, o governo não queria deixar que as assinaturas fossem coletadas. Foi derrotado. Depois tentou tirar as assinaturas. Foi derrotado. Depois tentou impedir que ela fosse implementada. Foi derrotado. Depois tentou ter o controle da CPI. Também foi derrotado. Então a simples existência da CPI já é uma derrota para o governo, com toda a certeza.”

A primeira semana de inquéritos, avalia Humberto Costa, já aponta uma sucessão de atentados cometidos pelo governo (clique no vídeo para ver a entrevista completa e se inscreva no TUTAMÉIA TV):

“Nós reforçamos aqui nossa avaliação de que o desastre da condução do enfrentamento da pandemia se deve ao fato de o presidente da República, de o governo ter adotado uma estratégia que se baseava na visão, equivocada e até criminosa, de fortalecer, estimular o processo de contaminação passiva da população para que, assim, ao se atingir um percentual de 70% da população contaminada, se desenvolvesse uma imunidade natural, uma imunidade de grupo de grupo, de rebanho.”

Trata-se de um crime, avalia o representante do PT da pandemia, que é médico: “Isso pode valer para uma gripezinha, para uma doença viral benigna, mas, para uma doença como a covid 19, representou um risco tremendo. Hoje o nosso entendimento é que o presidente cometeu um crime marcado por dolo eventual, ou seja, aquela situação em que se corre o risco de cometer crime sabendo das possíveis consequências. E hoje estão aí os mais de 415 mil mortos no Brasil para dizer do desastre dessa estratégia”.

Os trabalhos da CPI, no entender do parlamentar, podem contribuir para pôr fim a isso: “Como a CPI é um instrumento de investigação e de fiscalização do poder legislativo sobre o poder executivo, nós vamos pressionar para que o governo assuma determinadas posições que precisam ser assumidas se nós quisermos abreviar essa agonia desse enfrentamento à covid 19: mais vacinas, isolamento social, uso de máscaras, proteção para os profissionais da saúde, auxílio emergencial. É uma luta que pode ser reforçada com o trabalho da CPI”.

O que não significa a retirada automática de Bolsonaro, que ainda conta com apoio substancial na Câmara Federal e de uma parte da população, diz Costa: “Os ingredientes para o processo de impeachment não estão completos. A CPI pode ajudar, apontando mais crimes de responsabilidade. Pode ajudar com mais pressão, com mais denúncias, mas não é isso que vai garantir o processo de impeachment”.

Ao mesmo tempo, Bolsonaro vê minguar apoios, afirma Costa: “No empresariado, acho que ele mantém apoio apenas nesse setor do agronegócio mais reacionário e nesse lumpenempresariado, esses empresários da periferia das elites dominantes. Acho que o capital mesmo já perdeu as esperanças em Bolsonaro. Bolsonaro, agora, ao invés de ser um facilitador para a concretização dos interesses desses setores, ele se transformou num estorvo, num impedimento a isso. Acho que hoje há uma parcela muito grande que já não dá apoio a Bolsonaro. Até porque, se em determinado momento acreditou que essa dicotomia economia-saúde poderia ser útil a eles, já viu que não é. Ninguém vai conseguir retomar a atividade econômica, trazer investimentos se nós estivermos vivendo a pandemia do jeito que ela está hoje em nosso país”.

Para o parlamentar, a sustentação nas Forças Armadas também não é monolítica: “Já não há o mesmo apoio sólido. Entre o alto comando, com certeza não há. O que não significa que haja apoio para o PT ou para Lula, isso é uma ilusão. Mas, sem dúvida, há muita gente achando que as Forças Armadas foram longe demais em seu compromisso com Bolsonaro e notando que Bolsonaro prejudica a imagem e o papel das Forças Armadas. Ele ainda tem muita força nas polícias militares e nas chamadas milícias –que, até que se prove o contrário, são grupos que ele está armando, cada vez mais, para se preparar para um bote contra a democracia brasileira”.

E, do lado da oposição, surge novamente com força a figura de Lula, que passou os últimos dias em Brasília mantendo encontros com políticos das mais diversas tendências. A movimentação provocou reação no governo e nas forças democráticas, diz Costa:

“Não tenho dúvida de que esse surto que o presidente Bolsonaro está vivendo tem a ver com tudo isso. Tem a ver com a CPI, tem a ver com a desenvoltura do presidente Lula, inclusive conversando com aliados do governo nesse momento. Eu creio que o presidente Lula cumpriu aqui um papel muito importante, não em termos de uma articulação em torno de uma eventual candidatura, mas em termos de articulação de uma frente de resistência política ao governo Bolsonaro, às suas tentativas de atacar e de submeter a democracia brasileira, de implantar no Brasil uma ditadura. E isso é muito importante, isso é muito mais importante até do que buscar apoios para a eleição do ano que vem, é importante até para garantir a eleição do ano que vem.”

O que leva o líder do PT no Senado a avaliar que “há um caminho, um corredor muito grande aberto hoje para se enfrentar essa praga que acometeu o Brasil, que é o bolsonarismo”. Por isso, faz um chamamento: “Continuemos nessa luta. Hoje, mais do que nunca, nós estamos otimistas com a possibilidade de articularmos forças e, finalmente, podermos despachar esse governo, seja previamente, por intermédio de um processo de impeachment, seja, quem sabe mais provavelmente, pela eleição de 2022”.