A ascensão de Jair Bolsonaro ao poder coesionou o mundo putrefato fruto da violência policial letal contra os pobres. Há risco de golpe no país, e as instituições estão sendo apropriadas pelo fascismo. A avaliação é de Luiz Eduardo Soares em entrevista ao TUTAMÉIA (acompanhe no vídeo acima).
Segundo ele, é urgente a formação de uma ampla unidade no país para a realização de uma grande campanha de mobilização popular em defesa da democracia, com os partidos ousando “colocar em risco a sua própria sobrevivência, num sacrifício histórico”.
Escritor, cientista político, antropólogo, Soares foi secretário nacional de Segurança Pública no governo Lula. Está lançando “O Brasil e Seu Duplo” (Todavia), em que analisa as razões da chegada da extrema direita ao poder. Percorrendo a história e enfatizando o passado escravocrata, ele trata de racismo, de desenvolvimento, de religião, de desigualdade, de política, de cultura e de violência _seu campo preferencial de estudos.
Na sua avaliação, havia um bolsonarismo antes de Bolsonaro: grupos de policiais que atuaram na ditadura migraram  para o jogo do bicho e outros negócios e se transformaram em milícias. O pensamento desses bandos está baseado na execução extrajudicial, na defesa da tortura, na chamada justiça pelas próprias mãos _que já deixou de lado a “justiça” e se move pelos negócios.
“Os núcleos policiais armados bolsonaristas são oriundos da política de violência contra as populações pobres, da brutalidade policial letal, das execuções extrajudiciais. Esse mundo putrefato foi vertebrado por Bolsonaro. Já havia esse discurso selvagem que esperava por um messias”, afirma.


A ação das milícias infiltradas no Estado vai dar agora nos cassinos, alerta o antropólogo. “Bolsonaro está indo aos EUA negociar a vinda para o Brasil de grupos de cassinos cujos proprietários são grandes empresários transnacionais ligados ao crime organizado internacional, que fazem lavagem de dinheiro em grande escala. O próximo passo será a instalação de cassinos. Estamos falando da criação de um monstro que nasceu e se revigorou com o apoio total das instituições”, declara.
Na sua análise, é um equívoco dizer que as instituições estão funcionando normalmente. “Elas estão atravessadas, estão sendo de fato apropriadas, hegemonizadas por setores que saíram do armário sem pudor e têm inspiração fascista”.
De acordo com Soares, estamos num “sacrifício talvez terminal da soberania, porque o poder hoje instalado está dilapidando o patrimônio nacional de forma vergonhosa, acintosa, criminosa. Crimes de lesa pátria estão em curso, como a destruição da Petrobras, do que restava de mecanismos para o Estado produzir política. Há um nível de dependência inaudita em relação aos EUA. Não vivemos nada comparável, com o aparelho americano de controle, de vigilância no Brasil. O que a Lava Jato experimenta é exatamente o ensaio geral para essa promiscuidade”.
Além disso, ele enfatiza a aplicação “sem pejo da agenda neoliberal, com corte de direitos. Não só os direitos trabalhistas tradicionais, mas a aposentadoria e qualquer colchão de suporte, de apoio”. E aponta o cinismo do discurso do empreendedorismo para o trabalho precarizado.
Apesar do diagnóstico sombrio, Soares identifica a vitalidade e a pluralidade de movimentos populares de resistência como sinal de que a situação pode mudar. “A sociedade civil está com medo, mas está ativa. As possibilidades de mudança dependem de nós”.