“Quando eu era menino, meus pais eram muito católicos e foram fundamentais na minha formação. Meu pai, por 30 anos, foi presidente da Fundação Casa do Pequeno Trabalhador que hoje é a Fundação Casa do Jovem Profissional. Ao tempo de meu pai, meninos de 10 a 15 anos ali estudavam parte do dia; na outra parte trabalhavam, guardando automóveis, sendo engraxates, fazendo artesanato. Eu me lembro que quando ele ia lá, era recebido e abraçado como se fosse um segundo pai. Também ele costumava receber muitas pessoas no portão da minha casa. Às vezes eu o acompanhava, e ele me dizia: ‘Olha, filho. Mais importante do que você prover uma ajuda a essa pessoa é você ouvir a sua história’. Essa observação ficou guardada na minha cabeça, e eu, durante todo o tempo em que fui parlamentar, como deputado, senador, vereador, sempre procuro receber com atenção quem me procura. Não importa se for um governador, um senador, um médico, ou um morador em situação de rua: é preciso ouvir com atenção a sua história”.

A lembrança é do vereador Eduardo Suplicy, candidato à reeleição, que fala ao TUTAMÉIA sobre sua trajetória, seus projetos e sua visão de mundo. Com direito a duas versões de “Blowin’in the Wind” (Bob Dylan), a entrevista faz parte de série em que conversamos com concorrentes à Câmara que conhecemos e cuja trajetória política temos acompanhado nos últimos anos. O projeto se chama “Cinco Perguntas para Cinco Candidatos”, e dele participaram o líder sindical Edson Carneiro Índio, a dirigente do movimento dos sem teto  Carmen Silva, e os vereadores Juliana Cardoso e Antonio Donato. Eduardo Suplicy fechou a série.

Economista, administrador de empresas, Suplicy foi deputado estadual, federal, senador. Aos 79 anos, ele concorre à reeleição na Câmara de Vereadores obstinado em dar corpo ao seu projeto de renda básica de cidadania. Definida em lei federal, a ideia acaba de ter uma versão emergencial aprovada em São Paulo –R$ 100 por pessoa para as famílias que estão no Bolsa Família por um período de três meses, prorrogáveis enquanto durar a pandemia. A medida espera pela assinatura do prefeito para entrar em vigor.

Para Suplicy, o maior problema de São Paulo é “a enorme desigualdade de renda, de riqueza de condições de educação, saúde, serviços de cultura”. A desigualdade abissal pode ser sintetizada, diz o vereador, nos dados recentemente divulgados pela Rede Nossa São Paulo. “As pessoas que residem no Jardim Ângela têm uma idade média ao morrer de 58,3 anos. No Jardim Paulista, é de 81,5 anos. São 23 anos de diferença, uma diferença grande, que decorre das condições de renda, de qualidade de vida, de educação, de saúde. São Paulo tem a responsabilidade de modificar esse quadro, elevar o grau de justiça na sociedade, promovendo maior igualdade”.

Segue o vereador:

“Aqueles que votarem em mim terão meu compromisso de que estarei cumprindo as responsabilidades como vereador, exigindo do executivo total transparência das suas atividades e apresentando projetos. Votando em mim, as pessoas vão poder me ajudar a construir uma São Paulo mais humana, mais igualitária, com iguais direitos para todas as pessoas, em que todos venham a ter o direito de influenciar as decisões dos vereadores e do prefeito”.

LIVROS PARA BOLSONARO E GUEDES

Na conversa (acompanhe no vídeo acima e se inscreva no TUTAMÉIA TV), Suplicy conta que ficou assustado quando ouviu Bolsonaro, naquela famosa e abjeta reunião ministerial, defender a distribuição de armas para a população. Depois, quando o capitão ficou com covid e anunciou reclusão no Alvorada, tomou uma inciativa:

“Pensei: Quem sabe ele possa ler um livro. Enviei para ele “Utopia”, de Thomas More. Se ele acredita que para reduzir a criminalidade no Brasil é bom distribuir armas, eu disse: Pera lá! O livro, escrito em 1516, traz uma lição muito importante: é muito mais eficaz você assegurar a sobrevivência das pessoas, dando uma subvenção aos pobres. É uma das obras que melhor fundamentou o conceito da renda básica. Mandei para ele por Sedex. Recebi um agradecimento do seu chefe de gabinete. Mas ele não disse se Bolsonaro leu ou não. Estou esperando que ele possa aprender a essa lição. Mandei também para o Guedes. Em que pese eu ser da oposição e discordar dele, eu insisto em persuadi-lo”.

Suplicy lembra que Bolsonaro jurou cumprir a Constituição. Nela, está escrito no artigo terceiro: “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil construir uma sociedade livre, justa e solidária, garantir o desenvolvimento nacional, erradicar a pobreza e a marginalidade, reduzir as desigualdades sociais e regionais, promover o bem de todos, sem preconceitos de origem de raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.

“A forma mais eficaz de Bolsonaro cumprir suas promessas [de campanha] e o seu juramento à Constituição é instituir a renda básica de cidadania. Se ele o fizer, vou reconhecer. Até agora, ele não deu sinal de que quer fazer. Mas eu não desisto”.