“O nazismo não morre, infelizmente. É um animal que se reproduz. Esse animal também está incrustrado no Brasil. A antropóloga Adriana Dias contabilizou 350 importantes células nazistas em funcionamento no Brasil. Bolsonaro fala amanhã, 3 de fevereiro, na TPUSA (Turning Point USA), que é um covo de nazistas, o centro radical do nazismo”.
É o que alerta o jornalista José Luiz Del Roio ao falar para o TUTAMÉIA sobre os 80 anos da batalha de Stalingrado, completados neste dia 2 de fevereiro. Momento chave da Segunda Guerra Mundial, com ações inéditas e corajosas da população da cidade e do Exército Vermelho, a luta marcou o início da derrota do nazismo.
Escritor e radialista, Del Roio, 80, foi senador na Itália e membro da Assembleia Parlamentar da Europa em Estrasburgo. Com Carlos Marighella, fundou a ALN. Nesta entrevista, ele analisa a importância estratégica de Stalingrado, expõe os aspectos mais decisivos do enfrentamento e traça paralelos com a guerra travada hoje na Ucrânia.
Vladimir Putin, em discurso na cerimônia que marcou os 80 anos da batalha, também alertou para a contínua ameaça nazista. “Agora, infelizmente, vemos que a ideologia do nazismo, em sua forma e manifestação modernas, mais uma vez ameaça diretamente a segurança de nosso país”, declarou, acentuando:
“É inacreditável, mas é verdade. “Estamos mais uma vez sendo ameaçados por tanques alemães”.
Falando a milhares de pessoas em Volvogrado (Stalingrado), Putin disse que a Rússia tem certeza de que será vitoriosa na Ucrânia, como aconteceu 80 anos atrás.
Ao TUTAMÉIA, Del Roio lembrou do impacto de Stalingrado no mundo e leu trecho do poema de Carlos Drummond de Andrade sobre a batalha, que está no livro “ Rosa do Povo”, de 1945
Veja abaixo:
STALINGRADO
Depois de Madri e de Londres, ainda há grandes cidades!
O mundo não acabou, pois que entre as ruínas
outros homens surgem, a face negra de pó e de pólvora,
e o hálito selvagem da liberdade
dilata os seus peitos, Stalingrado,
seus peitos que estalam e caem,
enquanto outros, vingadores, se elevam.
A poesia fugiu dos livros, agora está nos jornais.
Os telegramas de Moscou repetem Homero.
Mas Homero é velho. Os telegramas cantam um mundo novo
que nós, na escuridão, ignorávamos.
Fomos encontrá-lo em ti, cidade destruída,
na paz de tuas ruas mortas mas não conformadas,
no teu arquejo de vida mais forte que o estouro das bombas,
na tua fria vontade de resistir.
Saber que resistes.
Que enquanto dormimos, comemos e trabalhamos, resistes.
Que quando abrimos o jornal pela manhã teu nome (em ouro oculto) estará firme no alto da página.
Terá custado milhares de homens, tanques e aviões, mas valeu a pena.
Saber que vigias, Stalingrado,
sobre nossas cabeças, nossas prevenções e nossos confusos pensamentos distantes
dá um enorme alento à alma desesperada
e ao coração que duvida.
Stalingrado, miserável monte de escombros, entretanto resplandecente!
As belas cidades do mundo contemplam-te em pasmo e silêncio.
Débeis em face do teu pavoroso poder,
mesquinhas no seu esplendor de mármores salvos e rios não profanados,
as pobres e prudentes cidades, outrora gloriosas, entregues sem luta,
aprendem contigo o gesto de fogo.
Também elas podem esperar.
Stalingrado, quantas esperanças!
Que flores, que cristais e músicas o teu nome nos derrama!
Que felicidade brota de tuas casas!
De umas apenas resta a escada cheia de corpos;
de outras o cano de gás, a torneira, uma bacia de criança.
Não há mais livros para ler nem teatros funcionando nem trabalho nas fábricas,
todos morreram, estropiaram-se, os últimos defendem pedaços negros de parede,
mas a vida em ti é prodigiosa e pulula como insetos ao sol,
ó minha louca Stalingrado!
A tamanha distância procuro, indago, cheiro destroços sangrentos,
apalpo as formas desmanteladas de teu corpo,
caminho solitariamente em tuas ruas onde há mãos soltas e relógios partidos,
sinto-te como uma criatura humana, e que és tu, Stalingrado, senão isto?
Uma criatura que não quer morrer e combate,
contra o céu, a água, o metal, a criatura combate,
contra milhões de braços e engenhos mecânicos a criatura combate,
contra o frio, a fome, a noite, contra a morte a criatura combate,
e vence.
As cidades podem vencer, Stalingrado!
Penso na vitória das cidades, que por enquanto é apenas uma fumaça subindo do Volga.
Penso no colar de cidades, que se amarão e se defenderão contra tudo.
Em teu chão calcinado onde apodrecem cadáveres,
a grande Cidade de amanhã erguerá a sua Ordem.
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