“Stálin foi uma das personalidades mais marcantes do século 20. Foi o construtor do estado soviético. E essa construção permanece, mesmo com as suas transformações. O grande Estado russo existe hoje em função dos projetos, da luta, da concepção de Stálin. Por isso que ele é tão recordado e celebrado na Rússia, no meio das suas contradições. Ele é o principal artífice da vitória contra o nazifascismo. Foi ele que enterrou o nazifascismo”.
Palavras do jornalista José Luiz Del Roio para TUTAMÉIA ao avaliar a trajetória e o legado do líder soviético, cuja morte completou 70 anos neste 5 de março de 2023.
Nesta entrevista (acompanhe a íntegra no vídeo e se inscreva no TUTAMÉIA TV), Del Roio tratou da trajetória de Stálin e de seu legado, debatendo controvérsias, seus êxitos e erros e as razões do processo de demonização da figura histórica.
Del Roio foi senador na Itália e membro da Assembleia Parlamentar da Europa em Estrasburgo. Escritor e radialista, fez parte da coordenação do Fórum Mundial das Alternativas e do Conselho Internacional do Fórum Social Mundial. Foi dirigente do PCB e um dos fundadores, com Carlos Marighella, da Ação Libertadora Nacional.
Na conversa com o TUTAMÉIA, Del Roio traça paralelos entre Stálin e dois outros personagens históricos, Robespierre (1758-1794) e Lincoln (1809-1865):
“Tudo foi jogado nas costas de Robespierre. Mas ele foi aquele que mais fez avançar a revolução na França e na Europa. Algo assim acontece com Stálin. Errou Robespierre? Errou, muito. Errou Stálin? Claro que errou. Trabalhar em certas condições históricas é complicado”, afirma.
Diz Del Roio:
“Como se constrói um estado moderno? Nunca é com flores. É sempre com muita luta. Lincoln, todo mundo diz maravilhas dele. Mas ele foi responsável por uma guerra que levou a centenas e centenas de milhares de mortos e milhões de mutilados, que foi a guerra civil norte-americana. Ele fez isso porque o Estado norte-americano não existia, estava se desfazendo, indo para o buraco. Ele é o construtor dos Estados Unidos Ele foi cruel? Não sei. Teve que lutar nas condições que foram dadas”.
O jornalista avalia que a demonização de Stálin foi uma necessidade política da reação: “Eles têm de combater tudo aquilo que possa pôr em perigo o capital, o grande capital, o domínio da hegemonia do capital monopolista internacional. A figura de Stalin é uma figura a ser batida. Infelizmente, como essa demonização foi ajudada por forças no interior do movimento comunista, facilitou muito. Hoje fazer uma análise de Stálin é difícil porque você imediatamente é apedrejado.”
Sobre isso, Elena Ódena, uma das fundadoras do Partido Comunista da Espanha, escreve: “Ao acusar vilmente Stalin de todos os tipos de crimes e injustiças, a reação, e mais tarde os revisionistas e renegados junto com ela, procuraram semear o descrédito e a desconfiança da revolução socialista e dos líderes e Partidos marxistas-leninistas, em geral, que continuaram a defender os princípios fundamentais do marxismo-leninismo, como Stalin os defendeu intransigentemente até sua morte. Trata-se sobretudo de negar e condenar o internacionalismo proletário ativo, a ditadura do proletariado, a necessidade do Partido como instrumento primordial da revolução e da construção do socialismo; o princípio da violência revolucionária e da luta de classes como motor da História (CLIQUE AQUI para ler a íntegra do texto).
Del Roio lembra que é Stalin quem formula o conceito de marxismo-leninismo: “Tem um livrinho dele (“Fundamentos do Leninismo”), que vendeu milhões e milhões de cópias em todo o mundo. Ele tenta divulgar uma teoria revolucionária para as massas. Tudo isso é perigoso, tudo isso é muito perigoso”.
Por isso, a ação propagandista contra o líder soviético: “Demonizaram toda a vida Fidel Castro. Quase todos os revolucionários são demonizados, porque atualmente o grande poder suave do imperialismo é a comunicação, é o domínio da comunicação. Então eles conseguem fazer isso, conseguem. Paciência, estamos aí na luta pela transformação.
E conclui:
“O importante é continuar a luta para achar caminhos que superem a hegemonia do imperialismo, do grande capital monopolista.”
Leia a seguir poema de Pablo Neruda escrito quando da morte de Josef Stálin.
EM SUA MORTE
PABLO NERUDA
Camarada Stalin, eu estava junto ao mar na Ilha Negra,
descansando de lutas e de viagens,
quando a notícia de tua morte chegou como um choque de oceano.
Foi primeiro o silêncio, o estupor das coisas, e depois chegou do mar uma onda grande
de algas, metais e homens, pedras, espuma e lágrimas estava feita esta onda.
de história, espaço e tempo recolheu sua matéria
e se elevou chorando sobre o mundo
até que diante de mim veio para golpear a costa
e derrubou em minhas portas sua mensagem de luto
com um grito gigante
como se de repente se quebrasse a terra.
Era em 1914.
Nas fábricas se acumulavam sujeiras e dores.
Os ricos do novo século
repartiam-se a dentadas o petróleo e as ilhas, o cobre e os canais.
Nem uma só bandeira levantou suas cores
sem os respingos do sangue.
De Hong Kong a Chicago a polícia
buscava documentos e ensaiava a metralhadoras na carne do povo.
As marchas militares desde a aurora
mandavam soldadinhos para morrer.
Frenético era o baile dos estrangeiros
nas boates de Paris cheias de fumo.
Sangrava o homem.
Uma chuva de sangue
caía do planeta,
manchava as estrelas.
A morte estreou então armaduras de aço.
A fome
Nos caminhos da Europa
foi como um vento gelado aventando folhas secas e quebrantando ossos.
O outono soprava os farrapos.
A guerra havia eriçado os caminhos.
Olor de inverno e sangue
emanava da Europa
como de um matadouro abandonado.
Enquanto isso os donos
do carvão,
do ferro,
do aço,
do fumo,
dos bancos,
do gás,
do ouro,
da farinha,
do salitre,
do jornal El Mercúrio,
os donos de bordéis,
os senadores norte-americanos,
os flibusteiros
carregados de ouro e sangue
de todos os países,
eram também os donos
da História.
Ali estavam sentados
de fraque, ocupadíssimos
em dispensar-se condecorações,
em presentear-se cheques na entrada
e roubá-los na saída,
em presentear-se ações da carnificina
e repartir-se a dentadas
pedaços de povo e de geografia.
Então com modesto
vestido e gorro operário,
entrou o vento,
entrou o vento do povo.
Era Lênin.
Mudou a terra, o homem, a vida.
O ar livre revolucionário
transtornou os papéis
manchados. Nasceu uma pátria
que não deixou de crescer.
É grande como um mundo, mas cabe
até no coração do mais
humilde
trabalhador de usina e oficina,
de agricultura ou barco.
Era a União Soviética.
Junto a Lênin
Stalin avançava
e assim, com blusa branca,
com gorro cinzento de operário,
Stalin,
com seu passo tranquilo,
entrou na História acompanhado
de Lênin e do vento.
Stalin desde então
foi construindo. Tudo
fazia falta. Lênin
recebeu dos czares
teias de aranha e farrapos.
Lênin deixou uma herança
de pátria livre e vasta.
Stalin a povoou
com escolas e farinha,
imprensas e maçãs.
Stalin desde o Volga
até a neve
do norte inacessível
pôs sua mão e em sua mão um homem
começou a construir.
As cidades nasceram.
Os desertos cantaram
pela primeira vez com a voz da água.
Os minerais
acudiram,
saíram
de seus sonhos escuros,
levantaram-se,
tornaram-se trilhos, rodas,
locomotivas, fios
que levaram as silabas elétricas
por toda extensão e distância.
Stalin
construía.
Nasceram de suas mãos
cereais,
tratores,
ensinamentos,
caminhos,
e ele ali
simples como tu e como eu,
se tu e eu conseguíssemos
ser simples como ele.
Porém aprenderemos.
Sua simplicidade e sua sabedoria,
sua estrutura
de bondoso coração e de aço inflexível
nos ajuda a ser homens cada dia,
diariamente nos ajuda a ser homens.
Ser homens! É esta
a lei Staliniana!
Ser comunista é difícil.
Há que aprender a sê-lo.
Ser homens comunistas,
é ainda mais difícil,
e há que aprender de Stalin
sua intensidade serena,
sua claridade concreta,
seu desprezo
ao ouropel vazio,
à oca abstração editorial.
Ele foi diretamente
desenlaçando o nó
e mostrando a reta
claridade da linha,
entrando nos problemas
sem as frases que ocultando
o vazio,
direto ao centro débil
que em nossa luta retificaremos
podando as folhagens
e mostrando o desígnio dos frutos.
Stalin é o meio-dia,
A madureza dos homens e dos povos.
Na guerra o viram
as cidades queimadas
extrair do escombro
a esperança,
refundida de novo,
fazê-la aço,
a atacar com seus raios
destruindo
a fortificação das trevas.
Mas também ajudou as macieiras
da Sibéria
a dar suas frutas debaixo da tormenta.
Ensinou a todos
a crescer, a crescer,
plantas e metais,
criaturas e rios
ensinou-lhes a crescer,
a dar frutos e fogo.
Ensinou-lhe a Paz
e assim deteve
com seu peito estendido
os lobos da guerra.
Diante do mar de Ilha Negra, na manhã,
icei a meia haste a bandeira do Chile.
Estava solitária a costa e uma névoa de prata
se mesclava à espuma solene do oceano,
Em metade do seu mastro, no campo de azul,
a estrela solitária de minha pátria
parecia uma lágrima entre o céu e a terra.
Passou um homem do povo, saudou compreendendo,
e tirou o chapéu.
Veio um rapaz e me apertou a mão.
Mais tarde o pescador de ouriços, o velho búzio
e poeta,
Gonzalito, acercou-se para acompanhar-me sob a bandeira.
“Era mais sábio que todos os homens juntos”, me disse
olhando o mar com seus velhos olhos, com velhos
olhos do povo.
E logo por longo instante não nos falamos nada.
Uma onda
estremeceu as pedras da margem.
“Porém Malenkov agora continuará sua obra”, prosseguiu
levantando-se o pobre pescador de jaqueta surrada.
Eu o fitei surpreendido pensando: como, como o sabe?
De onde, nesta costa solitária?
E compreendi que o mar lhe havia ensinado.
E ali velamos juntos, um poeta
um pescador e o mar
ao Capitão remoto que ao entrar na morte
deixou a todos os povos, como herança, a vida.
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