“O que sustenta Bolsonaro no cargo? Dinheiro na mão de deputados. É simples. Ele coloca dinheiro. Sabe dinheiro? Bufunfa? Grana? Ele coloca dinheiro na mão dos deputados. É por isso que a Câmara dos Deputados não avança nem para instalar a CPI. No Senado, conseguimos a CPI. Na Câmara, nem instalar a CPI se consegue. É por isso que ele se mantém no cargo”.

A afirmação é do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) ao TUTAMÉIA. Ele explica:

“O Centrão criou um tal de RP9, que é uma rubrica no orçamento. RP9 é o nome luxuoso para eles pegarem uma parte do orçamento, reservarem, colocarem sob o controle de Arthur Lira. E aí Arthur Lira, combinado com Jair Bolsonaro, distribui isso através de dotações extra orçamentárias para os deputados. A pergunta é: o que sustenta Bolsonaro no cargo? Dinheiro na mão de deputado. O que que cada um tem que fazer? Cobrar do deputado. Perguntar quanto ele está recebendo para manter Bolsonaro no cargo. Simples assim”.

Vice-presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia, ele fala na quarta, 27 de outubro de 2021, dia em que o Relatório da CPI foi entregue à Procuradoria Geral da República, ao Supremo Tribunal Federal e à ONU. Os dois volumes do documento, de 1.299 páginas, resultado de seis meses de trabalho, destrincham os crimes de Jair Bolsonaro e mais 79 pessoas e empresas e apontam uma série de medidas para o país superar esses tempos tenebrosos.

Nesta entrevista, Randolfe trata dos principais achados da CPI, de seus desdobramentos, da possibilidade de impeachment, da força da extrema direita e da necessidade de que o exemplo de frente ampla –exercitado no grupo parlamentar_ inspire a oposição no ano que vem (acompanhe a íntegra no vídeo e se inscreva no TUTAMÉIA TV).

“A CPI tem que ser um exemplo. Esse é o principal legado da CPI para o ano que vem: cada um deixar de lado qualquer pretensão individual, cada um se associar coletivamente. Não nos iludamos: vai dar trabalho derrotar Jair Bolsonaro no ano que vem. E vai dar muito mais trabalho, depois, reconstruir o país. A frente ampla que nós conseguimos na CPI tem que ser executada, completada nas ruas e nas urnas do Brasil no ano que vem. Na unidade dos diferentes”, declara.

Para ele, líder da oposição no Senado, “a instituição que funcionou com mais eficácia para conter Jair Bolsonaro, no último período, foi a CPI da Pandemia. Duas instituições funcionaram para conter os destinos de Jair Bolsonaro: a CPI e o inquérito de fake news do STF, presidido pelo ministro Alexandre de Morais”.

“Em que pese a blindagem que é montada em torno do presidente da República, nós vamos articular todos os caminhos para furar essa blindagem para que ele venha a ser responsabilizado”, afirma. Segue Randolfe:

“O Relatório da CPI é serviço para a história. A gente não pode dar trégua. Bolsonaro, semana passada fez uma live, lampeiro e pimpão, associando vacina à Aids. O que que é isso? É a CPI terminando e ele dizendo: ‘Eu vou voltar a colocar o Brasil no cercadinho’. Nós temos que dizer: ‘Vai não! Não tem a CPI, mas tem o relatório da CPI’. Nós vamos andar com esse relatório de CPI que nem troféu, apontando para o mundo os seus crimes até você ser punido. Vai ter uma hora que vai ser”.

Randolfe lembra que, com o fim da CPI, começa o trabalho do Observatório da Pandemia. “Vai ser uma frente parlamentar de acompanhamento. Uma frente ampla. Sabe a frente ampla, a comentada? Será essa frente ampla. Essa frente ampla vai levar esse relatório para todos os cantos. Até Haia, até o Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU, até a Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Esse livrinho não ficará em descanso eterno, em berço esplêndido”.

LUTA CIVILIZATÓRIA

Na entrevista ao TUTAMÉIA, Randolfe, formado em história, avalia a força de Bolsonaro:

“Não tenho a ilusão de que as hostes bolsonaristas estão murchando. Se trata de um governo de extrema direita fundamentalista. A história nos ensina que os fundamentalismos de extrema direita têm forte apelo populista. Foi assim com o fascismo, com o nazismo, com o franquismo, com o salazarismo, com o pinochetismo. Sempre há um caldo de apoio populista para a disputa na sociedade”. Ele continua:

“Bolsonaro, lamentavelmente, não é somente um personagem. O bolsonarismo deu identidade a alguns traços presentes, inclusive na fundação da sociedade brasileira: machismo, patriarcalismo, elitismo, patrimonialismo. Esses genes formadores da sociedade encontraram abrigo. Com um movimento dessa natureza sempre haverá um amplo lastro social. O que a CPI ajudou foi organizar a reação, principalmente nas redes sociais”.

Ao avaliar o comportamento da mídia durante a CPI, o senador afirma que a luta que está sendo travada hoje não é entre esquerda e direita.

“É uma luta civilizatória. A própria existência da imprensa livre exige a necessidade de que nós sejamos vitoriosos ao final dessa luta. Se a imprensa livre e democrática não dá as luzes a essa luta, o que vai ficar valendo como notícia é a corrente do WhatsApp, não é mais a notícia na sua fonte. É o que é dito nos grupos de zap. E isso é a barbárie”, diz.

Ele segue:

“É preciso em uma reação coordenada de todos, progressistas, conservadores, todos que acreditam na notícia, na informação. Porque a luta que estamos travando é uma luta civilizatória. Não temos uma força política no governo; temos uma coalizão do mal, do horror, da barbárie, da tragédia. A luta hoje é entre a manutenção e a existência de um estado democrático de direito mínimo, da liberdade de imprensa, do pacto civilizatório ou a barbárie, o horror”.