Por AQUILES RIQUE REIS, vocalista do MPB4
Não sei se eu já contei isto para vocês, se já contei, perdoem-me, se ainda não contei, lá vai: adoro escrever sobre disco instrumental. A satisfação de levar a público trabalhos importantes, gravados por pessoas que amam profundamente a arte de tocar um instrumento, dá em mim a boa sensação de estar fazendo a coisa certa.
Este preâmbulo é para comunicá-los que hoje tratarei de Xeque Mate (Kuarup), segundo álbum do baterista Mário Negrão Borgonovi, que está comemorando 50 anos de carreira.
Ao receber o novo trabalho do Mário, revisitei com prazer um passado que remonta aos anos 1970, quando ele tocou com o MPB4. Lembrei-me, também, de Madeira em Pé, seu primeiro disco solo lançado em 1980, trabalho comentado por mim em agosto de 2018, quando escrevi: “Mario Negrão tem pulso firme. Sua pegada é forte. Seus pés dão leveza ao bumbo e ao contratempo. A mão direita toca a caixa de forma precisa; a esquerda tange os pratos; ambas passeiam pela caixa e pelos tambores. Tocando bateria para a música, sem pirotecnias banais nem estridências desnecessárias, o músico se revela pleno”.
Foram recordações que me deixaram feliz e permitiram que eu me atirasse com convicção a escutar e escrever sobre suas atuais composições e sua batera, merecedoras que são de total atenção.
Hoje, ouço-o com admiração pela tenacidade dedicada à vida e à bateria. Negrão Borgonovi é hoje um instrumentista muito mais completo e realizado. Suas nove composições atuais dizem bem de como um homem motivado pode ousar ir além e tudo conquistar com seu talento.
Para gravar, Mário Negrão Borgonovi cercou-se de amigos instrumentistas e arranjadores. Com ele numa bateria standard, com três pratos ride (condução rítmica), estão Gilson Peranzzetta e Cristóvão Bastos no piano acústico e arranjos, Adaury Mothé no piano acústico (Steinway), Jamil Joanes no contrabaixo elétrico, Sérgio Barrozo e Rômulo Gomes no acústico, Rafael Rocha no trombone, Marcelo Martins na flauta e saxofone tenor, José Canuto no sax alto, Mauro Senise na flauta, Ricardo Pontes na flauta e sax alto, e Jessé Sadoc e Altair Martins no trompete e flugelhorn.
A tampa abre com “Xeque Mate”, tema que nomeia o album. Um samba suingado, que tem na batera a raiz que conduz os sopros, revelando a sedução da melodia e o vigor da harmonia. O arranjo de Cristóvão Bastos cerze com dignidade a personalidade musical de Mário Borgonovi. Desenhos dos sopros conduzem a uma virada da batera que deságua num solo da flauta de Marcelo Martins – piano e batera fazem a cama para ela. Um improviso do sax de José Canuto anota que ali o jazz tem sabor de brasilidade. Chega a hora de o piano de Cristóvão brilhar em solo. O flugel (Jessé Sadoc) entrega seu som marcante para o arranjo crescer ainda mais. E assim, brilhantes, levam o tema ao final.
Dou-lhes essa palhinha no intuito de animá-los a ouvir esse trabalho que dignifica a carreira instrumental de Mário Negrão Borgonovi: vão a ela!
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