Por AQUILES RIQUE REIS, vocalista do MPB4
Hoje trataremos de The Fisherman, primeiro álbum solo do batera e percussionista Humberto Zigler. Nascido no Rio Grande do Sul, vindo de uma família de pescadores, conheceu a música através de sons difusos ouvidos dia e noite. Vindos do mar e da areia, Zigler carregou-os vida afora. Foi através deles. e de muito estudo de música, que coube à vida desejar torná-los vivos.
Os peixes, o balaio, o arrasto, o barco, as marés, as fusas e semifusas, o tempo e o contratempo moldaram sua perspectiva de mundo. Fez-se marinheiro no asfalto e cidadão no swell. Marcando sua vida, ensinando-lhe que todo canto, toda pauta, todo toque, todo vento e todo peixe, serão seus companheiros vida afora.
Ouvindo os tambores primitivos do oeste da África – lá de onde veio a pujança ancestral, rítmica, tocada, dançada e cantada –, Zigler identificou parecenças com o samba e com a música norte-americana. E assim a ancestralidade incumbiu-se de irmanar, universalmente, as músicas e seus instrumentos.
Ao longo dos anos, aproximou-se de diversas linguagens musicais. O som das percussões ele foi buscá-los desde a África. O cantar das lavadeiras, ele ajuntou à coreografia do samba e da levada do berimbau. E uniu maxixe, ijexá e maculelê, às músicas tradicionais de Nova Orleans. E assim Humberto Zigler se fez baterista e pesquisador.
E foi através dessa pegada multidisciplinar que ele escolheu um repertório tão bom quanto eclético para o seu trabalho. Por exemplo, “O Cio da Terra” (Milton Nascimento e Chico Buarque) ganhou belo arranjo convencional: violoncelo, sax barítono, viola caipira e piano.
Mas foi com “Pescador” (Humberto Zigler) que ele realizou o desejo de ajuntar um canto de lavadeiras ao som característico do berimbau.
“Saci” (Humberto Zigler) abriu a tampa. No arranjo uma improvisação do sax barítono, numa levada de ijexá, a guitarra sola. A percussão faz a cama a quem faz jus.
“Tacho” (Hermeto Pascoal) soa com uma batera poderosa e uma extraordinária percussão, ambas nas mãos de Humberto Zingler, um grande instrumentista. Por outro lado, a força formidável de Zigler tem som de beleza viva.
“Trem da Vida” (Humberto Zigler) é interpretada por Maria Alvim. Seu timbre e sua afinação são seguros, o que já permite imaginá-la no seleto rol das boas intérpretes.
Zigler compõe como um pescador que busca canções no fundo mar e no raso da superfície. The Fisherman é um ótimo CD, vale a pena ouvi-lo.
Assim escreveu Humberto Zigler no encarte: “(…) De lá pra cá/ Muita coisa mudou (…) Da trama do cesto ecoa até hoje a voz dos homens/ A soada dos ventos/ E o rumo das marés (…).
Ficha técnica:
Concepção e produção: Humberto Zigler; arranjos e direção musical: Humberto Zigler; direção musical em Cio da Terra: Edu Malta; arranjo em Cio da Terra: Daniel Grajew; mixagem: Marcos Mauricio; masterização: Luis Lopes; direção de arte: Davik Martins; arte da capa: Alex Calebe; fotos: Ricardo Potí; foto de Humberto Zigler: Paulo Rapoport.
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