“O que ele diria? Ele diria: vamos nos organizar, pessoal, vamos nos reunir, vamos discutir, vamos debater e vamos enfrentar. Tem saída. Tem mais solução do que problemas no mundo. Então, vamos encontra-las e botar para quebrar. Ele estava sempre nos convocando a isso”.
É o que responde a socióloga Helena Singer à pergunta sobre o que Paul Singer poderia estar dizendo hoje. Ela fala ao TUTAMÉIA no final da manhã de 24 de março de 2022, data em que seu pai estaria completando 90 anos, dia que familiares, amigos, colaboradores próximos do economista escolheram para o lançamento do Instituto Paul Singer.
Singer, morto em 2018, era o que se chama de “intelectual orgânico”, pois associava a atividade acadêmica com a militância e a construção de movimentos. Nas palavras de Helena:
“Nos sentíamos compelidos a dar continuidade a esse legado enorme que ele deixou. São 30 livros individuais ou em coautorias, centenas de artigos científicos, milhares de artigos e colunas de jornal. Além de todas as organizações que ele ajudou a criar. Esteve na fundação do PT, do Cebrap, da secretaria nacional de economia solidária, da incubadora de cooperativas populares da USP. São muitos interlocutores na academia, na militância política, na gestão pública. E o Brasil está precisando desses diálogos, dessas construções, dessas propostas. É um momento muito sensível, dramático. Nos sentimos compelidos a criar um instituo para poder colaborar com esse momento do país” (clique no vídeo para ver a íntegra e se inscreva no TUTAMÉIA TV).
Antes de ser economista renomado, Singer foi trabalhador metalúrgico, liderando a greve de na indústria de São Paulo, em 1953. Professor na USP, teve seus direitos políticos cassados durante a ditadura militar. Foi secretário de planejamento da cidade de São Paulo, na administração de Luiza Erundina, e secretário nacional de economia solidária, no Ministério do Trabalho, nos governos Lula e Dilma.
PANDEMIA E ECONOMIA SOLIDÁRIA
Ao TUTAMÉIA, Helena aponta a defesa da democracia e do socialismo como pontos essenciais na trajetória de Paul Singer. Destaca também sua dedicação à economia solidária, cujas iniciativas frutificaram na pandemia, apesar do governo Bolsonaro.
“Os bancos comunitários e as moedas sociais tiveram um salto enorme na pandemia. Porque eles tinham a tecnologia de fazer chegar o dinheiro em quem precisa nas comunidades. Quando tudo se suspendeu, e boa parte da população brasileira não tem acesso aos bancos tradicionais, como fazer chegar a renda básica necessária para as pessoas sobreviverem durante a pandemia? Quem tinha essa tecnologia eram os bancos comunitários e também a tecnologia das moedas sociais. Durante a pandemia isso cresceu muito. Assim como todas as ações de solidariedade que fizeram com que chegasse às populações os bens de primeira necessidade”, lembra Helena.
Ela acrescenta:
“Lá no início, quando a gente nem tinha as máscaras, as máscaras foram feitas exatamente pelas cooperativas das mulheres que, sem ficar esperando que chegasse recurso do governo, se mobilizaram, se organizaram e produziram máscaras para distribuir na sua comunidade. Também houve os empreendimentos que fizeram chegar os produtos agrícolas, os alimentos para quem mais precisa, a partir de cadeias em que a solidariedade. Esperamos que, com muita fé, muita vontade, muita luta, que o ano que vem seja um ano em que o governo seja favorável ao ser humano. E não contrário, como o que nós temos hoje, e que isso possa se alargar e que a gente possa começar um processo de transformação desse país. Mas, apesar disso, também as ideias vêm prosperando”.
PROJETO ULTRACONSERVADOR NA EDUCAÇÃO
Helena, que tem pós-doutorado em educação, fala sobre a situação atual nessa área:
“O governo tem um projeto ultraconservador de país. É formar pessoas ultraconservadoras. Eles têm esse projeto: que os homens e mulheres sejam ultraconservadores, valorizem a estrutura atual, que é uma estrutura hierárquica, machista, racista, autoritária, violenta. Esse é o projeto deles; isso precisa de educação”.
Na sua análise, a iniciativa que mais expressa essa visão é o das escolas cívico-militares.
“É lamentável que haja governos –chamados de esquerda, inclusive– que implementaram as escolas cívico-militares, que não têm outro propósito que não seja formar as novas gerações nos valores dos ultraconservadores. Não existe outro motivo para você entregar uma escola na mão de policiais militares. É acreditar mais em policiais militares do que em professores. Não é que eles querem destruir a educação; eles querem implementar uma educação específica”.
Para enfrentar esse quadro, a partir de um novo governo, ela alerta para a necessidade de organização e avalia que haverá maior união entre os progressistas. Isso em razão dos ataques sofridos e até pela constatação “de que o outro lado se organizou bem”.
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