por AquilesRique Reis, vocalista do MPB4
Vou logo avisando a você que vai ler o que escrevi sobre Som na Cabeça (independente), CD do grupo vocal paulistano Canto Ma Nom Presto. Tudo bem, eu confesso, sou suspeito. Cara! Vocal é meu mundo. Nele me criei. A ele devo o que tenho e sou.
Vamos combinar, leitor, só creia em mim após ouvir Kenia Muraoka (soprano), Paula Del Rio (soprano), Joana Mariz (mezzo-soprano e preparação vocal do grupo), Andressa Feigel (contralto), Fábio Marins (tenor), Marcelo Recski (tenor e direção musical), Daniel Reginato (barítono e direção musical) e Leonardo Andrade (baixo).
Mas vamos lá: o Canto Ma Nom Presto são admiráveis malucos, daqueles de tacar pedra em santo. Sim! Pois só sendo doido para gravar arranjos com alto grau de dificuldade, cantados a capella, valendo-se apenas de suas vozes, afinadíssimas, abertas em acordes… Vozes solistas, vozes como instrumentos, vozes uníssonas, vozes.
O Canto Ma Nom Presto tem um quê de sublime. Eles, repito, só cantam a capella. Suas vozes criam sons com chocante semelhança aos instrumentos. Ora fazem vocalizes, ora cantam as melodias. Por vezes as vozes femininas abrem vocal, assim como também as masculinas. E cantam juntos, em uníssono, contrapontos, cânones…
Instigante, o disco flui: “Ironia” (Paulinho da Viola), por exemplo, tem arranjo de Xavier Bartaburo e a voz de Mauricio Pereira – suas divisões rítmicas são preciosas e seu cantar enriquece o Canto. As vozes masculinas fazem as vezes de baixo e trompete; as femininas cantam no registro agudo dos instrumentos de percussão.
“Felicidade” (Luiz Tatit) tem arranjo de Wilson Alves e solo do autor. As vozes femininas fazem contracantos. A voz de Tatit passa uma ingenuidade que nada mais é do que a genialidade de um músico único a reforçar o Canto.
“Ladeira da Memória” (Zé Carlos Ribeiro) tem arranjo de Marcelo Recski e participação de Ná Ozzetti e Paulo Tatit. Chega a voz delicada de Ná. Paulo sola – sua voz é muito parecida com a de Ná. O octeto faz vocalises. Após uma sequência harmônica, aberta em vozes, um acorde fecha a tampa da canção.
“Clara Crocodilo” (Arrigo Barnabé e Mário Lúcio Cortes), com arranjo de Daniel Reginato, tem a voz de Arrigo recitando o texto inicial da composição. As vozes femininas interferem, as masculinas as protegem com a força dos que cantam junto. Pirante, o arranjo a todos conduz para o lado experimental da composição. Coisa de gênio. Cantos e contracantos se sucedem. Arrebatadores. Até que Arrigo, eloquente que só ele, recita o trecho final da obra, inquirindo um “canalha” para saber se ele vai ou não ajudar “Clara Crocodilo”: “Ou será que está adormecido em sua mente [do canalha], esperando a ocasião propícia para despertar e descer até seu coração… ouvinte meu, meu irmão?” Caramba! Aqui estou eu todo desmilinguido…
Ora, eu estou, isso sim, é orgulhoso da musicalidade pop do Canto Ma Nom Presto. E por quê? Porque eles são o que eu já fui, sou e serei: amante do cantar junto.
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