“A política desse governo é tirar o Brasil dos brasileiros. Estão vendendo o nosso patrimônio para fazer caixa. Temos que ter um espírito de país para garantir o nosso patrimônio”. É o que afirma ao TUTAMÉIA Miguel Torres, 59, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo e Mogi das Cruzes e da Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos, e vice-presidente da Força Sindical.

Ativista sindical desde o final dos anos 1970, Torres diz que os trabalhadores precisam ter maior participação política e defende o direito de Lula ser candidato. “Esse medo dessa classe que quer derrubar o Lula de qualquer jeito é o medo de enfrentar as urnas. A voz do povo é que vai decidir, no voto, na eleição”.

Torres aponta interesses estrangeiros no processo acelerado de privatização e desnacionalização promovido por Michel Temer. São “grandes grupos que estão por trás disso, [interesses] da Shell, das companhias de transgênicos, é mundial. Teremos que ter a capacidade de enfrentar isso, levar o debate e denunciar”, declara.

O metalúrgico condena a ideia de venda da Eletrobrás, especialmente para estrangeiros. “É um risco estratégico”, alerta. Criticando os valores irrisórios citados para a venda, ele diz: “Ainda vão falar, como fizeram na Cemig, do sucesso do leilão. E vão enganando o povo e tirando o nosso patrimônio”.

Nesta entrevista exclusiva, Torres discutiu os retrocessos embutidos na reforma trabalhista, a reação dos trabalhadores e a necessidade de reunião das centrais para o enfrentamento das medidas governamentais.

Na sua avaliação, conquistas trabalhistas de 100 anos estão sendo derrubadas pelo governo. O resultado é a proliferação de bicos, empregos informais, que deixam o trabalhador cada vez mais vulnerável, com jornadas instáveis e pagamento menor.

REFORMA TRABALHISTA NÃO ACABOU

Ele adverte que o quadro ainda pode piorar com a ascensão de candidatos contra os interesses dos trabalhadores. Citou o discurso de Flávio Rocha, presidente da Riachuelo, que prega um arrocho ainda maior. “Quem achou que a reforma trabalhista acabou, ela não acabou. Temos que resistir para impedir a aplicação da reforma”.

Torres defende uma ação coletiva das centrais, passando por cima de divergências ideológicas, para unificar uma pauta conjunta. O que estaria nessa pauta? Ao menos três pontos: 1. Revisão da reforma trabalhista; 2. Mudança na proposta da previdência e 3. Discussão de um plano nacional de desenvolvimento com geração de emprego.

“Se não discutirmos isso, o país vai continuar nessa draga que está hoje. Não temos política industrial, agrícola, de comercio. Nada. Há lampejos, desonera aqui, dá uma anistia ali. Não resolve o problema, que é o de ter uma indústria forte. Não existe país desenvolvido no mundo que não tenha a indústria como seu principal alicerce”.

Torres lamenta o esmagamento do polo naval de Rio Grande, a decisão do governo de importar plataformas da China, a venda da Embraer à Boeing. “Daqui a pouco é a Petrobras que vão vender –e a parte lucrativa vai para os outros”, afirma.

GLOBALIZAR A LUTA

Apesar das derrotas e dos tempos tenebrosos para os trabalhadores, Torres diz que o momento está servindo para aproximar sindicatos de distintas posições políticas. Nos últimos tempos, por exemplo, metalúrgicos de todo o Brasil conseguiram se organizar. A greve geral do ano passado foi considerada um sucesso. E há também a aproximação com entidades sindicais de outros países, especialmente os latino-americanos.

“Se pode globalizar o capital, vamos globalizar a luta”, diz, lembrando que as reformas de destruição de direitos trabalhistas estão varrendo o mundo todo. A exceção está na Alemanha, onde o movimento sindical conquistou avanços importantes recentemente.

Integrante do movimento sindical desde o final dos anos 1970, Torres avaliou a trajetória dos combates trabalhistas nas últimas décadas. Apontou a Constituição de 1988 como ponto especial de conquistas. E observou que, depois disso, a divisão entre os trabalhadores e a partidarização das centrais afetou o desenvolvimento das lutas.

“Não tem jeito de viver em sociedade se não se viver organizado. Se hoje está ruim para os trabalhadores, sem o sindicato com certeza vai ser pior. Sem o movimento sindical, guardadas as devidas proporções, [voltaríamos] ao que era em 1917. O trabalhador tem que participar. A luta faz a lei”.

LULA TEM DIREITO DE SER CANDIDATO

O líder sindical espera que a eleição deste ano signifique uma boa renovação no Congresso, com a entrada de nomes identificados com a luta dos trabalhadores. Hoje essa bancada está em torno de 40 parlamentares; chegou a reunir 70 no passado. “O que está em jogo não é o movimento sindical, são os trabalhadores”.

Com outras lideranças sindicais, Torres participou, em janeiro, de evento em apoio ao presidente Lula. Ao TUTAMÉIA ele comenta a hipótese de Lula ser impedido de participar das eleições de outubro:

“Lula é companheiro. Foi um presidente que conseguiu diminuir a desigualdade, conseguiu avançar na parte social do país, deixou o país em evidência. Teve erros. Isso não anula o que ele fez de bom. Precisamos estar sempre atentos aos interesses que estão sendo jogados. Defendemos que Lula tem o direito de ser candidato. Quem vai julgá-lo é a população. Vai mostrar se é ele ou é outro que venha com outra proposta. Esse medo dessa classe que quer derrubar o Lula de qualquer jeito é o medo de enfrentar as urnas. Querem deixar um mínimo de candidatos, um bonitinho aqui, um mais ou menos ali, vem outro com uma metralhadora. Defendemos que Lula seja candidato, sim. A voz do povo é que vai decidir, no voto, na eleição”.