Parlamentar que votar a favor da reforma da previdência do governo não deve receber o voto dos eleitores na eleição deste ano. O recado é de d. Angélico Sandalo Bernardino, em entrevista ao TUTAMÉIA. Bispo emérito de Blumenau, ele considera que o projeto é contrário aos interesses populares e prejudica as mulheres os anciões e os trabalhadores. A propaganda oficial é mentirosa, diz.
Para Bernardino, o golpe que derrubou a presidente Dilma Rousseff tem o objetivo de acabar com o poder popular e terá continuidade com a retirada de Lula da disputa eleitoral.
“Foi um golpe em cima do poder popular, para que não tivéssemos o povo no poder. Quem deu o golpe foi o poder econômico, apoiado pelo parlamento. O que o poder econômico nacional e internacional não quer ver é o povo no poder ”, declara.
Bernardino defende que o Brasil precisa “evoluir e respeitar o voto popular”. Diz que as reformas em andamento estão sendo feitas para “favorecer o capital e alienar o povo”. Sugere, por exemplo, que mudanças na previdência comecem pela cobrança aos devedores do sistema.


Amigo do presidente Lula, ele afirma que não há isenção na Justiça e identifica uma “desigualdade escandalosa” nos encaminhamentos dos processos contra políticos. Enxerga comprometimentos no parlamento, no judiciário e na polícia.
Nesta entrevista ao TUTAMÉIA, Bernardino lembrou dos tempos em que havia um forte movimento das comunidades eclesiais de base, ainda durante a ditadura militar. Militante da Pastoral Operária, rememorou passeatas pela cidade, quando a palavra de ordem “O povo unido jamais será vencido” era entoada por milhares nas periferias.
Hoje, ele lamenta a falta de trabalho da igreja católica nas comunidades mais pobres e recomenda um maior engajamento de religiosos nas lutas populares. O distanciamento entre católicos e periferia ajuda a explicar a falta de reação ao golpe. E também o avanço das denominações neopentecostais entre as populações mais carentes. “A igreja se encolheu nos trabalhos das comunidades eclesiais de base”, diz.
Entusiasta do papa Francisco (ele mostra aos repórteres uma foto com ele), Bernardino espera que essa situação se modifique, com o maior envolvimento de católicos com as causas dos mais pobres, a mensagem mais forte vinda hoje do comando do Vaticano. Mesmo lá, ele observa, há resistências enormes.


“Temos responsabilidade social; o cristianismo não é alienação”, afirma o bispo. Na sua visão, vivemos numa era de desmobilização, o que afeta sindicatos, movimentos populares. Nesse quadro, advoga, “as igrejas que têm compromisso histórico libertador precisam se dar as mãos”.
Na conversa, Bernardino lembrou do convívio com d. Paulo Evaristo Arns (1921-2016) e de episódios marcantes, como o assassinato do operário Santo Dias da Silva, durante greve em 1979.
Ele nos recebeu em sua casa no Jardim Primavera, zona Norte de São Paulo. Falou das carências da periferia paulistana (ele morou anos em São Miguel Paulista, zona Leste, antes de ir para Blumenau SC).

E criticou o abandono dos bairros pobres pelo prefeito João Dória Jr. (PSDB). Condenando o marketing que proclama uma “Cidade Linda”, fez questão de mostrar o mato e a sujeira na praça ali na borda da avenida Inajar de Souza. “É uma vergonha! Por que a Avenida Paulista é cuidada e a periferia abandonada?”.