UMA HORA DO MAIS OPULENTO JAZZ BRASIL
Por AQUILES RIQUE REIS, vocalista do MPB4
O som vem subindo a ladeira que conduz aos ouvidos de quem sente que vai rolar instrumental do bom no CD. À medida que o tema se dá a perceber, a atenção se aguça – há que não deixar que coisa nenhuma, por mais ínfima que seja, passe sem deixar um sabor de boa música instrumental no ar.
E esse som que se achega de mansinho é de Resiliência (Blaxtream Jazz Production), CD de estreia totalmente autoral do bom guitarrista, violonista e compositor Vinícius Gomes.
O álbum, que teve um belo trabalho de gravação e mixagem assinado por Thiago Monteiro, traz dez músicas só de Gomes e uma em parceria com Fernando Amaro. Vinícius Gomes foi de violão e guitarra e contou com Edu Ribeiro (bateria), Rodrigo Ursaia (sax e flauta), Bruno Migotto (contrabaixo acústico) e Gustavo Bugni (piano). Um grupo sabedor de suas qualidades e de seu formidável apetite para bem tocar seus instrumentos.
Afora as participações especiais do trompete de Rubinho Antunes em quatro faixas e da bateria de Daniel de Paula em uma, dois belos destaques foram o arranjo e a regência de Gustavo Bugni para um quarteto de cordas, formado por Ricardo Takahashi (primeiro violino), Daniel Moreira (segundo violino), Daniel Pires (viola) e Vana Bock (cello).
Pois é, chegando devagarzinho em fade out, eis que “Resiliência” (VG), o primeiro tema do CD, abre-se por inteiro ao ouvinte. A batera e o piano puxam a intro. O sax sola e o contrabaixo marca a levada. Depois o solo é da guitarra. Duos nascem. As cordas vêm com tudo – a harmonia ajuda. Volta a guitarra, desta feita solando por mais compassos. A batera se esbalda. A guitarra se desdobra em mil sons. O sax toma o improviso para si: seu fraseado aguça a sonoridade jazzística. Agora é o piano que sola. Contrabaixo e batera são o pulso da interpretação. As cordas estão ainda e mais uma vez presentes. O arranjo segue pro fade in final.
Após uma intro poderosa, o sax traz a melodia de “Êxodo” (Vinícius Gomes e Fernando Amaro). Piano e batera sustentam os compassos, enquanto o baixo segura a vibe do sax. Com desenhos ascendentes, o arranjo é supimpa. Arritmo, a guitarra vem solar. Os instrumentos tocam quase aleatoriamente, dando ao tema um ar ainda mais modernista. Cada um mais inspirado do que o outro, o couro come. Mas o final é inevitável… Meu Deus!
O trompete inicia “Valsa” (VG). A guitarra e a batera estão com ele. Bela melodia. Duos e solos se sucedem. O primeiro e bonito improviso é do contrabaixo, depois o trompete traz o solo para si – muitos e generosos compassos servem tanto a um quanto o outro. A guitarra chega e brilha. A batera vai nos pratos. O trompete sola até que o piano pegue o improviso. Lá vem o final.
Resiliência é não apenas uma sessão opulenta de jazz moderno, como também um deleite. Nele, Vinicíus Gomes se dispõe a fazer do jazz brasileiro um irmão univitelino do norte-americano e (por que não?) daquele que hoje é criado e ouvido nos quatro cantos do mundo.
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