A denúncia de que o governo Bolsonaro fez uso de “números errados, havendo indícios de falsificação” para justificar a Reforma da Previdência fez com que seis centrais sindicais se unissem para solicitar ao Senado a imediata suspensão da tramitação do projeto que, na prática, inviabiliza a aposentadoria da maioria dos trabalhadores brasileiros. Em carta enviada a cada um dos senadores, os trabalhadores lembram estudos de professores da Unicamp que demonstram que “os cálculos [do governo] manipulam os dados sem respeitar a legislação e inflam o custo fiscal das aposentadorias atuais para justificar a reforma e exagerar a economia fiscal e o impacto positivo (inexistente) sobre a redução da desigualdade da Nova Previdência”.
O resultado da eventual aprovação da Reforma tal como está, baseada em dados falsos, será uma tragédia para o Brasil, assim descrita pelas centrais sindicais: “Os aposentados por idade com salários médios até 65% acima do salário mínimo terão descontos que os levarão a receber apenas um salário mínimo na aposentadoria, jogando milhões de famílias dependentes de aposentados na pobreza. Número ainda maior escapará por pouco da pobreza. Aposentados por tempo de contribuição que contribuem sobre um salário mínimo e receberiam o mesmo terão que esperar por até 16 anos a mais para se aposentar”.
A seguir, a íntegra da carta enviada pelas centrais sindicais
CUT, Força Sindical, CTB, CSB, UGT e NCST.
Prezados Senadores e Senadoras,
Há muito temos denunciado o caráter perverso e injusto da Reforma da Previdência proposta pelo atual governo, por meio da PEC nº 6, de 2019, e suas terríveis consequências para o país e, sobretudo, para os trabalhadores e trabalhadoras.
Diante da denúncia de professores da Unicamp – realizada após análise aprofundada dos dados fornecidos pelo Ministério da Economia – de que os números presentados pelo governo estão errados, havendo indícios de falsificação, solicitamos a V. Exas. que, em defesa da democracia e do Estado democrático de direito, suspendam a tramitação da PEC 6/19 até o esclarecimento dos fatos.
A acusação é gravíssima. Dizem os professores da Unicamp que “os cálculos manipulam os dados sem respeitar a legislação e inflam o custo fiscal das aposentadorias atuais para justificar a reforma e exagerar a economia fiscal e o impacto positivo (inexistente) sobre a redução da desigualdade da Nova Previdência”.
Ao refazer os cálculos oficiais com o uso das normas vigentes legalmente, os professores da Unicamp demonstram que, para o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), o subsídio para as aposentadorias dos trabalhadores mais pobres diminui, ou seja, resultado absolutamente diferente do que o apresentado pelo governo que diz que o benefício aumenta com a reforma da previdência.
A análise revela ainda que as aposentadorias por tempo de contribuição (ATC) obtidas nas regras atuais com idades mais novas (e forte desconto do Fator Previdenciário) geram superávit para o RGPS e têm impacto positivo na redução da desigualdade. Este resultado se verifica inclusive considerando pensões por morte oriundas de ATCs e é conhecido há muitos anos, desde pesquisas científicas feitas, por exemplo, pelo próprio ex-secretário da Previdência Marcelo Caetano, entre outros.
Diferentemente do que argumenta o governo, a análise da Unicamp conclui que “a abolição da ATC resulta em déficit para o RGPS”. Para compensar esse déficit, a PEC 6/19 muda os critérios de acesso e cálculo, reduzindo os benefícios e aumentando a pobreza sob o pretexto de “simplificar” o sistema ao unir regras de tempo de contribuição e idade mínima.
Com isso, os aposentados por idade com salários médios até 65% acima do salário mínimo terão descontos que os levarão a receber apenas um salário mínimo na aposentadoria, jogando milhões de famílias dependentes de aposentados na pobreza. Número ainda maior escapará por pouco da pobreza. Aposentados por tempo de contribuição que contribuem sobre um salário mínimo e receberiam o mesmo terão que esperar por até 16 anos a mais para se aposentar. Ambos se concentram nos estados mais pobres da federação, que mais dependem dos benefícios previdenciários próximos do piso salarial.
A análise conclui, portanto, que o aumento do subsídio para os mais pobres pós-reforma é falso. Como o superávit alegado pelo governo com a abolição da ATC apenas adia aposentadorias, com custo fiscal maior para as gerações futuras, a estimativa de economia com a reforma também é enganosa e se concentra nos mais pobres.
Em audiência pública realizada na Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal, na última sexta-feira 20/09, o Secretário da Previdência Social, Leonardo Rolim, responsabilizou a Secretaria de Política Econômica pelos cálculos errados. Contudo, ele acompanhou o Ministro da Economia e Secretário Especial de Previdência e Trabalho em várias ocasiões em que estes números foram apresentados e não os criticou antes. Ao invés de defender a planilha com os cálculos falsos, a resposta oficial ao estudo da UNICAMP, divulgada pela Secretaria de Previdência, fez novas afirmações falsas sobre o uso de valores de Fator Previdenciário, Sobrevida, Regra 85/95 e Pensão por Morte que não correspondem ao estudo criticado.
Como pode o Senado Federal, Casa revisora composta por lideranças experimentadas, tomar conhecimento de denúncia tão grave e não exigir esclarecimentos convincentes antes de votar matéria de tamanha relevância e altíssimo impacto na vida de milhares de pessoas?
Se já é uma submissão inaceitável o Senado Federal abrir mão de fazer as alterações na PEC 6/19, reconhecidas como necessárias pelo relator – tanto que propôs uma PEC paralela – e ainda por cima votar o relatório sem que a denúncia de que os números não correspondem à realidade, apresentada por renomada Universidade, seja devidamente apurada?
Por estas razões solicitamos, encarecidamente, que a apreciação da PEC 6/19 seja sobrestada até que as denúncias dos professores da Unicamp sejam esclarecidas.
Esperamos que V.Exas. adotem esta medida e exerçam as atribuições constitucionais reservadas ao Senado Federal – como Casa revisora – para o bem do povo e do Brasil.
Antonio Neto, presidente da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB)
Adilson Araújo, presidente da Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB)
Vagner Freitas, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT)
Miguel Eduardo Torres, presidente da Força Sindical
José Calixto Ramos, presidente da Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST)
Ricardo Patah, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT)
Deixar um comentário