Por AQUILES RIQUE REIS, vocalista do MPB4

Novembro de 2022

Admirável Tom Zé, me lembrei que desde junho eu aguardo o seu novo CD Língua Brasileira, lançado pelo Selo SESC-SP, e aproveito para saudar todos os profissionais que o acompanharam nessa jornada. Garanto procê que desde então eu vivi uma expectativa meio juvenil. Mas os dias foram rolando e nada de eu receber o tal do CD físico, prometido pela assessoria. “Pera lá, Aquiles, não minta pro Tom Zé.” Foi mal, Tom Zé! – o SESC bem que tentou entregar o álbum lá em casa por duas vezes. Mas não havia ninguém para receber o ansiado. Sabe o quê, TZ, a campainha da minha casa é fraquinha e mesmo quanto estou em casa eu mal ouço a gastada tocar. E foi da decepção à frustração que eu lamentei por não ter o seu disco físico. Mas aí, tchan tchan tchan tchan, a Neusa entrou em cena! Com carinhosa firmeza, ela perguntou se eu sabia que você tinha lançado um novo trabalho – respondi de pronto que sim. Com a presteza de um anjo ela sacou que eu estava doidinho pra ter seu CD e, se fosse capaz para tanto, dizer algo sobre ele. Pois bem, estou eu aqui, ouvindo-o. A esperança é que eu absorva, ainda que minimamente, toda a genialidade de um tratado sobre a língua brasileira, dividido em onze capítulos, emprenhados por sua desafiadora criatividade, que ouvi com arrepios e lágrimas. C é doido, Tom Zé? Nada! C é, é pop e desabusado! Como você me cutuca desse jeito, véio? A partir de hoje, a língua brasileira não é mais a mesma. Ela agora tem gosto de gente viva, de verbos que se transmutam e criam novos conceitos. Coisa de quem sabe e de quem conhece o âmago dos termos que exprimem o que somos, sempre em popular evolução dialética. A língua brasileira, aprés você, Tom Zé, faz da esperança um vício que nos energiza e toca. Você é o cavalo a carregar o sentido da nossa identidade. Sua música é o desenho da cara da nação dos brasileiros. Sua voz traz a rouquidão das ruas. Suas levadas e suas poesias são formas de revelar a magnitude dos povos indígenas, como, por exemplo, no arranjo colossal de “Hy-Brasil Terra Sem Mal”: “(…) Uma ilha sem fuzil/ Sem ba-ba-ba-baba-bala civil/ Índio brasileiro/ Procurava por um local:/ Era um paraíso chamado Terra Sem Mal;/ Ali a lavoura nascia sem plantar,/ Flecha ia caçar,/ Era só́ beber e dançar/ E como dançar é se purificar,/ Assim, nessa terra sem mal,/ O índio é imortal (…)”. Se cheguei até aqui, TZ, foi mero impulso de sobrevivência. Eu precisava lhe dizer, também, o que senti ao ouvi-lo recitar palavras crescidas pelo coro em “A Língua Prova Que” – e que levada é aquela, mermão?: “Olorum, Olorum, vós sois o pão, ó pai!/ Olorum, Olorum, a luz também me dai, Olorum, Olorum,/ O coração tomai, Olorum, Olorum – me levantai!/  E Olorum, pra começar a criação, chamou: ‘Orinxanlá, vai lá!/ Vai criar a terra e a semente,/ Obatalá, vai lá!/ Vai criar um ser inteligente,/ Um ser que venha ser, para com os orixás,/ Humilde, bom e obediente.’ (…)”. Exuberância! Receba minha gratidão por tê-lo entre nós.

 

Aquiles