“Militarmente os EUA perderam no Afeganistão. É uma derrota do projeto americano, mas eles lucraram com a guerra. A elite norte-americana ganhou um dinheirão. A guerra contra o terror aumentou o poder americano”.
A avaliação é do sociólogo Reginaldo Nasser ao TUTAMÉIA, horas após a queda de Cabul, no domingo, 15 de agosto de 2021. Professor de relações internacionais da PUC-SP, ele está lançando no mês que vem “A Luta Contra o Terrorismo: os Estados Unidos e os Amigos Talibãs” (Editora Contracorrente).
Para ele, o poder estadunidense no mundo continua intacto e até cresceu nesses vinte anos após o 11 de Setembro. Acompanhe a íntegra no vídeo e se inscreva no TUTAMÉIA TV.
“Não foram os atentados que mudaram o mundo. O que mudou foi a guerra contra o terror. Os EUA poderiam agir contra o terrorismo de várias outras formas, não essa. No ano de 2002, morreram duas mil pessoas por atentado terrorista. Há três anos, morreram 50 mil; agora está caindo. Aumentou o terrorismo no mundo, aumentou o número de grupos terroristas. 85% das vítimas do terrorismo são muçulmanos; 90% das vítimas do contraterrorismo são muçulmanos”, assinala.
Ele afirma:
“O aparelho de Estado foi se reconfigurando, o aparelho policial, o de vigilância. Tudo isso mudou em 20 anos. Uma grande mudança. Isso não tem nada a ver com o Taleban. É um subterfúgio. Lá no Afeganistão fizeram uma guerra tradicional, ocuparam um país que não tinha nada a ver com o atentado. Zero. Como também em relação ao Iraque”.
E segue:
“Essa ideia de ter um argumento para atacar alguém, extremamente mentirosa, foi aceita. Ir lá, arrebentar com o país, e depois dizer: foi um equívoco. Ninguém fez autocritica, nem critica dentro dos EUA. O Afeganistão é um elemento dentro desse contexto maior. O Império entra, faz a espoliação, mata gente, e um belo dia diz: é… vamos embora”.
Nesta entrevista, Nasser avalia que a retirada norte-americana também tem o objetivo de gerar instabilidade na região, o que afeta especialmente a China, além de Rússia, Paquistão e Índia.
A queda de Cabul, para ele, “não feriu a imagem militar dos EUA”, e a tendência é o governo norte-americano trabalhar no sentido de fazer a opinião pública esquecer os fatos.
“No mínimo 400 mil afegãos morreram; 2.500 norte-americanos. Dizem que os EUA gastaram 2 trilhões de dólares no Afeganistão. Não gastaram, investiram. Esses dois trilhões foram parar na elite americana, uma pequena parte para os afegãos. Eles ganharam dinheiro com a guerra. Cresceu a indústria de armas, a construção civil. Construíram rodovias completamente sem sentido. Também deu lucro para a indústria de alimentos, remédios. Os empreiteiros de guerra ganharam e foram embora. Foi a guerra mais longa. Foi lucrativa e se esgotou”, aponta.
“É uma máquina da elite norte-americana que perpassa republicanos e democratas. E não para de crescer. Em 20 anos cresceu assustadoramente. Uma máquina que cresceu sob o argumento do terrorismo. Que tem tortura regulamentada. Isso se difundiu para o mundo. Países passaram a adotar o padrão dos EUA. Isso é a hegemonia”.
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