“Os empresários estão confusos, meio desorientados, porque essa gente toda participou do golpe contra Dilma, do impeachment, essa gente toda colocou o dedo em riste em relação a Lula, apoiou a operação Lava Jato, essa gente toda ajudou a desestabilizar o processo. E isso acaba afetando a eles e aos próprios negócios. Então estão meio desorientados sobre isso. Estão vendo que a conjuntura que está se desenhando é a de levar a uma disputa entre Lula e Bolsonaro. Uma parte, por ter um pouco mais de consciência democrática, entende que não é uma polarização normal da política, porque Bolsonaro está no campo do fascismo, Lula está no campo da democracia. Então uma parte do empresariado diz: vamos ficar com a democracia. Eu acho isso muito bom porque vão ter de nos ajudar a reconstruir. Agora tem uma outra parte que não caiu a ficha.”
Essa é a avaliação da deputada federal Gleisi Hoffmann, presidenta nacional do PT, falando ao TUTAMÉIA ao final de uma semana política especialmente movimentada. O projeto bolsonarista de voto impresso foi derrotado no Congresso, apesar das bravatas do presidente, que incluíram inédito desfile militar em Brasília, em mais uma fracassada tentativa de intimidação dos parlamentares e das instituições.
A parlamentar aponta: “Em vez de cuidar do país, enfrentar a pandemia, cuidar das pessoas, se dedicar a ter mais vacinas, cuidar da renda, para que as pessoas vivam melhor, Bolsonaro solta suas bravatas autoritárias e vem com outro tema, que não tem a ver com a realidade das pessoas neste momento, que são as eleições de 2022, a questão do voto impresso. É uma cortina de fumaça exatamente para ele fugir da responsabilidade que ele tem sobre a crise que se abate sobre o país. O fato é que ele perdeu na Câmara Federal. Essa questão do voto impresso, ele sacou da cartola para tumultuar o processo eleitoral. A urna eletrônica é reconhecida no mundo inteiro como um sistema seguro de votação. Ele fica questionando o sistema para tumultuar o processo e para, lá na frente, dizer que houve fraude porque ele não foi eleito.”
E continua: “Ele com certeza não vai ser reeleito. Um presidente que atua como Bolsonaro não tem voto. Então o que ele quer demonstrar? Que ele tem força. E aí fez aquele desfile patético, fez as Forças Armadas pagarem um preço…, aquele desfile patético na Esplanada dos Ministérios. Fez o Brasil passar vergonha, porque mostrou a fragilidade dos equipamentos das nossas Forças Armadas. Como se com isso, ele pudesse ter força, ou persuadir o Congresso ou o Supremo Tribunal Federal. Não só no dia, a Câmara votou contra o voto impresso, como o próprio Supremo, pouco depois, no outro dia, abriu outro inquérito contra Bolsonaro. Acho que as instituições estão começando a ter posição mais firme em relação a isso”.
As ações de Bolsonaro, no entender de Hoffmann, são uma demonstração de fragilidade do presidente: “Ele está se sentindo muito acuado, está sentindo muito sozinho –que é o que ele está, sozinho, isolado—nessa sandice toda que ele faz, de transformar a Presidência da República num lugar de enfrentamento político e disputa ideológica. Acho que a tendência é ele perder mais apoio popular, embora ele ainda mantenha um núcleo conservador, de extrema direita, que tem visão fascista do processo, preconceituosa, que acaba o apoiando. Estão aí as bases das milícias, parte da Polícia Militar, mesmo das Forças Armadas, mas não tem força suficiente na opinião pública, nas instituições, para dar um golpe no Brasil.”
Golpe, aliás, que foi aventado em texto distribuído pelo Santander a sua comunidade, dias atrás. O que também foi alvo de críticas da líder petista: “É uma infelicidade para o Santander, um banco estrangeiro que atua no Brasil, ter um economista que faça uma avaliação desse tipo de atentado à democracia. Ou seja, eles não querem eleições livres, democráticas, querem a tutela do povo. Se o povo escolher Lula não pode porque a elite do país não quer Lula, porque o sistema financeiro não quer Lula? Peraí! O tempo da aristocracia já passou, a República Velha já foi, quando eles decidiam quem governava, e não consultavam o povo. Hoje nós temos o voto universal, todas as pessoas votam –acima de 16 anos quem quer, acima de 18 anos é obrigatório. Então não pode ter tutela da aristocracia.”
Trata-se de uma visão que perde apoio da sociedade, afirma Gleisi Hoffmann (clique no vídeo para acompanhar toda a entrevista e se inscreva no TUTAMÉIA TV):
“As instituições, o Congresso e o Supremo Tribunal Federal estão alinhados pela prevalência da democracia, para que as eleições sejam eleições livres, limpas e democráticas. As Forças Armadas teriam de se expor muito para fazer uma situação como essa, causar uma instabilidade. Bolsonaro vai tentar causar, e pode ser que parte das Forças Armadas queiram estar junto com ele. Se as Forças Armadas Brasileiras não quiserem se atolar nessa desgraça que é o governo Bolsonaro, nesse desastre que é esse governo, vão ter de se posicionar de maneira institucional, como forças de Estado, e não com posicionamento político.”
A presidenta do PT também comenta as recentes tentativas de aproximação do governo Biden com Bolsonaro: “O Biden está fazendo com o Brasil um jogo que interessa à geopolítica norte-americana: não deixar que a China amplie sua influência econômica e política. Então ele está tentando se aproximar de Bolsonaro. Mas é uma relação difícil”.
E segue: “É claro que nós estamos de olho nos movimentos dos americanos, é claro que isso faz parte das preocupações que temos de ter nessa caminhada, e o que nós temos de fazer é denunciar essas ações ou essas investidas, inclusive para o Congresso norte-americano, para os setores progressistas, para outros países do mundo, para ficarem de olho aqui. Não é mais a década de 1960, que os Estados Unidos vêm aqui e intervêm. Eles fizeram uma intervenção, no governo Dilma, através de um golpe, que não tinha base constitucional, e criaram uma instabilidade institucional no Brasil. Estamos vivendo uma instabilidade em razão de toda essa articulação. Nós não podemos permitir isso de novo. Temos de denunciar muito, para constranger essas ações, e não permitir que façam um golpe. Cada vez mais a gente tem de apontar para que a sociedade tenha coesão, para que a gente tenha força, e não deixe que esses interesses venham acima dos interesses da soberania nacional”.
União que deve envolver amplos setores da sociedade, incluindo o empresariado:
“Nós nunca fomos contra o empresariado. Sempre achamos importante o fortalecimento das empresas, principalmente as empresas nacionais, ter uma indústria forte, um empresariado com condições de fazer negócios no Brasil, ter estabilidade, ter financiamento para ampliar seus negócios, porque achamos que isso gera emprego, gera renda e gera desenvolvimento. Acho que tem, na maioria das vezes, um preconceito dos empresários em relação ao PT e em relação ao Lula. Mesmo tendo demonstrado, no nosso governo, que podíamos fazer um governo em que todos pudessem ganhar –e todos ganharam, mas o andar de baixo da sociedade, os mais pobres ganharam mais, mas ninguém saiu perdendo–, essas pessoas não aguentaram com seu preconceito.”
Ela chama para o debate: “Estamos abertos para conversar com todos os setores empresariais. Eles nos conhecem, conhecem Lula. Está na hora de o setor empresarial e o setor financeiro que atua no Brasil, que ganha muito, dizerem o que querem fazer pelo Brasil e pelo povo brasileiro. Esse é o recado. Nós não temos problema nenhum em fazer uma frente ampla com o empresariado, com esses setores, para tirar Bolsonaro e defender a democracia. Aliás, temos conversado com vários setores da sociedade, o presidente Lula tem se reunido com lideranças que não têm posições iguais às nossas, porque nós entendemos que temos de fazer um enfrentamento a esse desastre do Bolsonaro”.
Enfrentamento em que os interesses do povo podem vir a ser vitoriosos, diz Gleisi Hoffmann: “A gente jamais pode deixar de ter esperança. Nosso papel é esperançar o povo brasileiro. A gente já viveu momentos muito difíceis neste país, conseguimos vencer, avançamos. Acho que este é um dos momentos que requer uma unidade do povo brasileiro e uma esperança grande para a gente superá-lo. O Partidos dos Trabalhadores continua na luta e continua no intento de formar um grande arco de pessoas e posições políticas em favor da democracia e da defesa do processo democrático, que vai culminar com as eleições de 2022”.
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