Por Aquiles Rique Reis, vocalista do MPB4
Foi em novembro de 2008 que eu ouvi Zimbher pela primeira vez. Compositor, cantor e produtor cultural, ele então lançara zimbher & o’zunido. À época meus ouvidos, de fato, zuniram. Tanto que nomeei seu álbum de “Música pra aturdir”. Meus sentidos, aturdidos, zunzunavam.
Foi há doze anos que Carlos Zimbher se mostrou indecifrável para mim. Ele tinha de tudo um pouco, de muito ele tinha um tudo, tanto que pensei, tanto que suscitei, tanto que tentei, que até pensei tê-lo descoberto. Não, longe disso.
Tanto em 2008 quanto em 2020, tangenciei suposições, ouvi sons, percebi poemas e arranjos, e assim escrevi: “‘Não tenho medo de música!’ [Desde então], esta afirmação de Egberto Gismonti incentiva à coragem de se abrir ao novo e à novidade, que podem acender um mágico mundo aonde nossos ouvidos jamais imaginariam chegar. Audácia que permite ao ‘corajoso’ conhecer a música que muitos não querem dela sequer ouvir falar, que dirá escutar o que ela tem a dizer”.
Atrevido de tudo, embrenhei-me na missão de, quem sabe, descobrir por que Zimbher é difícil de resumir. E foi assim que disse do seu CD anterior: “No mundo da música não há nada definitivo. Não há ritmo que subjugue outro, não há gênero que possa se proclamar o tal, nem há forma de interpretação que possa se pavonear de deixar as outras no chinelo. Em música tudo pode, desde que a alma se abra a ela e permita-se descobrir outra forma de criação”.
E hoje, em tempos de covid-19, o ex-capitão-presidente insiste em mentir para nós que, perplexos, nos vemos relegados à condição de um rebanho a ser morto para que a economia floresça e o ex-capitão-presidente se reeleja. Há um plano diabólico em andamento: milhões hão de morrer! E daí?
Bem, vamos em frente: Zimbher traz inspirações da vanguarda paulista. Seja de Itamar Assumpção a Luiz Tatit ou do Premê a Arrigo Barnabé, o cara bebe nas águas (im)puras da contracultura de 1922. E o faz com tal capacidade modernista que trisca em Tom Zé.
Homem Nu (independente) tem doze faixas, nas quais sente-se que tudo está dito. Mas não está. É como se ele fosse vanguardista, sem ser ou sendo. E o ouvinte que se vire para aconchegar os miolos e sentir que nem tudo é para sempre.
Arranjos e instrumentações são pontes para concepções. Não tente enquadrá-los. Ouça e sinta – mas vou logo dizendo: você correrá o risco de bater a caçoleta.
A voz de Zimbher está encorpada – notas graves são com ele mesmo. Os versos, ah, os versos, eles têm humor? Têm! Têm sofrência? Têm! Têm crítica social? Têm…
As harmonias de Zimbher integram-se às melodias com achados bem resolvidos. Suas músicas privilegiam o pop, mas têm boas relações com a diversidade da música popular brasileira.
Eu ouço: “Mas se ele é isso tudo que você fala, por que não diz logo que ele é o maior cantor, letrista e compositor do mundo? E afinal, então, quem é esse cara?”
Eu respondo: “Ora, ele não é o que idealizamos, certos de que o sabemos: Zimbher é um conceito”.
Deixar um comentário