Quem é de São Paulo aprendeu que o 9 de Julho é dia de comemorar a “Revolução Constitucionalista”. O movimento, de 1932, foi uma tentativa de golpe da reacionária elite aristocrática paulista contra o governo de Getúlio Vargas –que mudaria definitivamente o Brasil, erguendo o Estado nacional e industrializando a economia (o que iria beneficiar o empresariado paulista, mas isso é outra história).

Mas existe um outro 9 de julho. Nesse dia, em 1917, o operário José Martinez foi assassinado pela repressão em meio aos protestos durante a greve que paralisava a cidade de São Paulo naquele momento. A indignação pela sua morte incendiou mais a luta. Liderada sobretudo por mulheres, a inédita greve geral foi vitoriosa. Obteve conquistas, ainda que efêmeras. Deixou a semente que geraria, anos mais tarde, a criação do Partido Comunista do Brasil.

É esse 9 de Julho de luta popular que foi lembrado em manifestação que reuniu lideranças políticas, sindicais, intelectuais, militantes de direitos humanos na região do Brás, em São Paulo, nesta segunda-feira. Ali, num dos galpões que guardam a memória daqueles dias turbulentos, houve discursos, cantoria, homenagens. José Luiz Del Roio, histórico ativista político, recebeu a medalha Anchieta, comenda da Câmara de Vereadores de São Paulo, e o Diploma de Gratidão da Cidade de São Paulo, por sua história de vida dedicada à organização e à defesa do movimento operário brasileiro -a manifestação foi transmitida ao vivo por TUTAMÉIA, e o registro está no vídeo no alto desta página.

Del Roio com o diploma que lhe foi entregue por Antonio Donato

Del Roio foi membro do PCB. Após o golpe de 1964, saiu do partido, com Carlos Marighella, para fundar a ALN. Perseguido pela ditadura militar, atuou no exterior. Para Itália levou e preservou o arquivo do movimento operário (hoje disponível na Unesp). Naquele país, foi eleito senador pelo Partido da Refundação Comunista e membro do Parlamento Europeu.

Hoje, aos 76 anos, ele relembrou sua trajetória –alinhavada por todos que falaram na solenidade. E falou de um terceiro 9 de Julho –o da Revolução de 1924, que desaguou mais tarde na Coluna Prestes. Naquela revolta dos anos 1920, os tenentistas exigiam mudanças radicais no país. O governo central bombardeou a população civil –ali mesmo, perto de onde se realizava a homenagem. O morticínio foi enorme; analistas falam em crime de guerra. Mas, nas salas de aula, ainda prevalece o 9 de Julho da tentativa de golpe reacionária e elitista.

É para resgatar a memória do movimento popular que o 9 de Julho foi definido como Dia da Luta Operária pela Câmara Municipal, uma proposta do vereador Antonio Donato, que também teve a iniciativa para a realização da homenagem a Del Roio.

Na primeira comemoração, no ano passado, algumas dezenas de pessoas assistiram a uma palestra de Del Roio sobre o movimento centenário. Foi quando ele lançou seu livro “A Greve de 1917” (Alameda Editorial). Agora, mais de uma centena de pessoas participaram do evento, que começou com uma apresentação do Coro Luther King. Cantaram “A Internacional” –entoada pela primeira vez no Brasil exatamente durante aquela greve.

Na sucessão de discursos, um misto de memória, história e a luta de hoje. “Lula Livre!” foi a palavra de ordem. Na véspera, o imbróglio jurídico sobre a prisão/soltura do ex-presidente galvanizou as atenções do país e expôs a parcialidade de setores da Justiça. Lula continua preso, mas o processo escancarou a perseguição. No frigir dos ovos, a avaliação que predominou afirmava que o balanço era positivo: a defesa de Lula voltou aos destaques do noticiário, foi para a ofensiva, e a possibilidade de soltura mexeu no cenário político.

Del Roio, em entrevista ao TUTAMÉIA, definiu Lula como um “sequestrado num ambiente hostil, cheio de ódio. Ele corre perigo de vida. É crime hediondo. Temos que arrancar o presidente Lula daquele ambiente perigoso. Para sua saúde e para a sua vida”.

Na sua visão, o juiz Sérgio Moro está “a serviço do capital, da anti-nação”.

No final da celebração, houve brinde com vinho e o brado de “LulaLivre!”