“Fizemos juntos o zazen, que é a meditação sentada. A respiração dele era longa, contínua e tranquila. Então você sabe que o estado emocional dele é tranquilo”, disse a líder zenbudista monja Coen ao TUTAMÉIA, recordando em muitos detalhes a visita que fez ao presidente Lula na prisão, em Curitiba.

“Ele tinha um olhar doce, de uma ternura tão grande”, lembra a líder religiosa de 71 anos, que nos deu entrevista nesta quarta-feira, 15.8, o exato dia do registro da candidatura de Lula à presidência da República.

“Eu estava muito preocupada, pensando em quem eu iria votar.  Eu não vou votar em branco, eu vou votar em alguém. E fiquei muito contente de saber que Lula é candidato à Presidência. Se não for ele, quem o representar”, disse a monja, explicando assim as razões de sua escolha: “Lula foi um presidente excelente e é por isso que a gente quer dar continuidade para aquilo, que foi muito bom”.

Apesar de satisfeita com a conquista do dia, ela não deixa de mostrar preocupação com o quadro que vive hoje o país: “As pessoas vêm cochichar para mim: “Monja, eu votei no Lula”, e não são capazes de falar em voz alta. E eu queria saber que medo é esse que nós estamos vivendo que as pessoas têm medo de se posicionar. Elas cochicham para mim nos lugares. Por que tem de falar baixo? Por que estamos com medo de nos posicionarmos? Por que essa agressão? As pessoas são ameaçadas de que, se puserem em suas redes sociais que são a favor do Lula, não vão ter emprego, vão ser mandadas embora… O que é isso? Estamos falando de democracia, mas não estamos vivendo em uma democracia.”

Ela mesma sofreu perseguição, ataques, críticas porque visitou o líder político na prisão, conforme disse ao TUTAMÉIA (confira no vídeo acima):

“Minha visita ao presidente Lula causou muito impacto. Muitas pessoas chegaram para mim: “Como você foi lá? Ele é um ladrão!” E eu: “Não é um ladrão, não, minha filha. Você tem de olhar melhor. Quem é que fez bem a este país…As pessoas vêm muito agressivas falar conosco. Uma amiga de adolescência parou de falar comigo porque eu visitei o Lula. O que é isso? Que absurdo! Eu sou uma religiosa. Como religiosa, eu visito detentos. Já fui muitas vezes no Carandiru, nas cadeias femininas para visitar detentos. E eu tenho direito a ter um partido político.”

E continua: “Eu acho que todos têm direito à sua escolha. Eu não vou insultar aqueles que pensam diferente de mim, e eu espero que eles não me insultem e que reconheçam que nós podemos pensar diferente. Essa cisão, essa polaridade, não leva a nada positivo para nós, seres humanos, para a humanidade, para o planeta.”

Ao contrário, a polarização, a divisão, só torna mais fácil a dominação: “Uma sociedade polarizada é controlável. Se uma sociedade está unida, não tem quem a possa controlar. Na hora em que você divide os povos, divide as pessoas, e cria grupos adversos, você tem poder sobre eles, porque os enfraquece. Há interesse maiores que querem e gostam de ter as coisas divididas, principalmente aqueles que produzem armas. Acho que a indústria armamentista tem muito a ver com isso”.

O caminho precisa ser outro, alerta a monja: “Precisamos criar uma cultura de paz, uma cultura de não violência ativa, uma cultura que compreende o outro mesmo que ele seja diferente. Não odiar o outro, mas ser capaz de debater, de dialogar, em vez de discutir e de querer ganhar a discussão”.

Foi esse espirito, aliás, que ela contou ter encontrado no presidente: “Ele me disse que não tem raiva de ninguém, que é triste ver o Brasil assim tão polarizado. E eu concordo plenamente: por que nós temos de odiar quem não pensa como eu penso? Estamos falando de democracia e da possibilidade de termos partidos diferentes, pontos de vista diferentes, e não precisamos insultar ninguém nem ficar com raiva de quem pensa diferente”.

O problema, diz ela, é que hoje no Brasil há uma revanche contra a democracia, contra o que foi construído nos governos Lula e Dilma. Tenta se implantar uma cultura do medo, obrigar as pessoas se esconderem: “Fale em voz baixa senão você perde seu emprego. Não se manifeste, não fale, não diga nada”.

E ela mesmo contrapõe: “Isso não é possível. Nós temos o direito de falar. Nós temos de ter liberdade de expressão. Não podemos calar as vozes das pessoas, não podemos amedrontá-las por causa de seus pensamentos políticos. Então deixamos de ser uma democracia”.

Por isso, a monja Coen manda uma mensagem: “Este é um ano muito importante, em que vamos escolher deputados, senadores, governadores, o presidente. Está na hora de pensar quem você vai por lá. Falaram tanto que ia melhorar, e ficou pior. Cabe a nós fazer uma análise de como está agora, de como pode ficar, e quem são os personagens que podem nos levar a um estado de melhoria social, política, econômica, ambiental para todos. E eu acredito que Lula é quem encabeça isso”.

Ela adverte que há uma orquestração para evitar que as pessoas percebam isso: “Nossa mente pode ser enganada por uma grande mídia, que não está nem divulgando o que está acontecendo porque quer Lula seja esquecido, que todo esse movimento não existe, quer fingir que não está acontecendo nada”.

Ao mesmo tempo, fazem contra Lula uma campanha que a monja considera “virulenta”, que tenta isolar as pessoas, atemorizar.

Olhando para a câmara, procurando falar nos olhos de quem a vê na tela, Monja Coen diz: “Existe uma pressão muito forte, mas não se importe com essa pressão. Aqueles que estão com medo de falar não precisam ter medo porque não estão sozinhos: somos muitos. Você não está sozinho, são milhões de pessoas que votam com você, que acreditam nos mesmos propósitos, nos mesmos princípios, nos mesmos valores. Nós estamos falando de metade da população do Brasil. Não estamos falando de um grupinho pequeninho, nós estamos falando da maioria. Nós estamos dizendo que o nosso pensamento, o pensamento de Lula Livre, é o pensamento da maioria dos brasileiros, não é da minoria”.

O que não significa que tudo vai dar certo, que tudo vai ser fácil: “O que nos pedem é que agora a gente vá de porta em porta. Ou seja: faça sua parte. Não espere que alguém, faça por você. Somos nós que temos que nos posicionar, temos de falar e temos de mostrar o que realmente está acontecendo”.

De qualquer forma, muita calma nesta hora, recomenda a monja: “Este é um período conturbado e difícil. Esses meses serão muito difíceis, de muitos abusos de poder, até em locais de trabalho, as pessoas então devem se manter firmes em seus propósitos, não se dobrem, não se deixem ser ameaçados por ninguém, mantenham seus pontos de vista, mantenha a sua liderança no seu local de atuação. Saiba que momentos como este aconteceram em todos os países do mundo. Vamos atravessar essa turbulência. E acredito que, atravessando essa turbulência, que não sabemos de quanto tempo será, a luz retornará. Eu tenho certeza disso. Porque só existe esse caminho para a humanidade”.